Crônicas

“Você disse some e eu somei. Eu disse some e você sumiu”

“Você disse some e eu somei. Eu disse some e você sumiu”

A matemática do amor e dos relacionamentos em geral é complicada. Cada um de nós tem um jeito único de ver e entender as coisas. Encara as próprias equações e se atrapalha. Quando é pra somar, divide ou multiplica. Faz isso, conforme a quantidade de minhocas passeando nos neurônios recheados de esquisitices. Fato é que mora em nossas cabeças um perseguidor implacável. Ainda que o escondamos. O asfixiemos com as mágoas do coração. Finjamos ser ele nosso melhor amigo. O algoz existe e respira feroz.

Saudade até do que era pra ser e não foi

Saudade até do que era pra ser e não foi

Minha geração tem um cacoete: quem não morreu ficou velho. Mas não pense que minha geração é dessas que passam pela vida impunemente. Não. Minha geração é bicho feral. Minha geração disse a que veio. Não apenas disse, mas fez o que prometeu fazer: mudar o mundo. Olhe que não é uma tarefinha à-toa do tipo construir uma Transamazônica ou uma Ferrovia Note-Sul, que são obras de vulto, mas têm, até certo ponto, apenas impacto local. A nossa geração é maior: veio para mudar o mundo. E aprontou.

O amor quando acontece, a gente esquece logo que sofreu um dia

O amor quando acontece, a gente esquece logo que sofreu um dia

Tirou a bala da coxa dela e sentiu que aquele estremecimento interior devia, sim, ser o tal amor à primeira vista. Pensem numa mulher bonita. Imaginem agora que ela flutue, que possua um par de pernas tão gigantescas e acolhedoras que façam com que qualquer sujeito se sinta na obrigação de derrubá-las, como se fosse um avião penetrando nas Torres Gêmeas. Ah… Certa vez, namorei uma trinca de gêmeas siamesas que miavam no quintal dos meus delírios como gatas embriagadas de amor. Uma gozava em falsete, outra fazia a segunda voz, e a terceira não dava um só piu, um ui que fosse: odiava-me.

Carta para alguém que espera

Carta para alguém que espera

Hoje voltou o frio. Veio como havia muito não vinha. Gelou o ar, esfriou o sofá da sala, resgatou meias, casacos e dores do fundo de uma gaveta que emperra como não quisesse abrir. Chegou sabe-se lá de onde, do pacífico, dos polos congelados, do sul do país. Não importa. Aqui faz frio. Em seu sopro fresco e úmido, esse frio há de aquecer os ímpetos de alguém. Há de animar as almas boas que se reúnem no calor de suas mesas, em volta de suas histórias contadas na fumaça perfumada das panelas bafejando decência. A mim, o frio me reencontra desprevenido e ridículo.

As histórias de cada um de nós passeiam pela vida afora

As histórias de cada um de nós passeiam pela vida afora

Logo no início da sessão ela teve vontade de falar do mar, da selvagem vitalidade que encontrava ao se entregar inteira às espumas. Vontade de esmiuçar as danças sinuosas nascidas das ondas, agitadas como serpentes, os polvos imensos, regentes das profundezas melódicas com seus tentáculos de maestros das águas. Ela quis comentar dos mares antigos, desbravados por navegadores desejosos por lamber novas terras recendendo à coragem e à sabedoria de conchas ancestrais.