Crônicas

Só quem tem gatos entende esse amor louco que nós temos por eles

Só quem tem gatos entende esse amor louco que nós temos por eles

Parece que dentro do olhar felino encontramos luz, mistério e serenidade para os nossos problemas, e o ronronar dos gatos é melodia e conforto pro nosso cansaço. Facilmente nos apaixonamos pelo veludo macio de pelos que acariciam a nossa pele e pelas almofadinhas das patas que caminham levemente sobre nós. Mas os mimos e carinhos começam e terminam quando o gato quiser, e nós aprendemos a conviver bem com isso.

Por que Deus permite que as mães vão-se embora?

Por que Deus permite que as mães vão-se embora?

Minha mãe tem quase oitenta e fica enfezada, não gosta nem um pouco do jeito desbocado com o qual lhe testo a fé e a paciência. Faço isso de propósito, para atazanar na dose certa, para exercitar os seus neurônios e coronárias. É preocupante: ela anda com lapsos de memória e palpitações. Ela fica furiosa. Então, levanta, vai coar um café a meu gosto: forte e com pouco açúcar. Ela usa um coador de pano encardido, enfiado dentro de um bule surrado que, de tão antigo, parece ter pertencido a Cora Coralina, antes dela se tornar uma poeta famosa.

A preguiça é inimiga da perfeição. Não há talento que resista à falta de empenho

A preguiça é inimiga da perfeição. Não há talento que resista à falta de empenho

É provável que não tenhamos ideia dos bastidores da consagração daqueles por quem nutrimos admiração (quis ser gentil e não usei o termo inveja). O médico renomado que abdicou de parte da juventude debruçado sobre livros e acordado em plantões. A bailarina ovacionada nos palcos do teatro municipal enquanto suporta as dores dos pés feridos. Os sapos engolidos pelo executivo de alto poder que começou no térreo da hierarquia. Os infinitos rascunhos rasurados do poeta premiado pelos versos bem sucedidos… Na coxia de cada vitória, há um enredo de luta trilhado na contramão do comodismo.

Viver é esquisito

Viver é esquisito

Não tenho planos de morrer logo, portanto, se tudo correr bem, vou permanecer vivo tempo suficiente para perder vitalidade, definhar, adoecer e arriar de vez, feito a bateria do meu carro. Sim. Viver é esquisito. Mesmo assim e, por causa disso, até mesmo para manter a mente e o corpo minimamente saudáveis e ocupados com tribulações menos inquietantes do que as fatigadoras crises existencialistas, espero trabalhar até morrer ou ficar louco.

É melhor deixar pra lá… Um pouco de desprezo economiza bastante ódio

É melhor deixar pra lá… Um pouco de desprezo economiza bastante ódio

A vida já é complicada demais para estarmos continuamente com a língua afiada e os dedos em riste, prontos para o ataque digital. Ando exausta com a desgraça humana e com toda a miséria, fome e desigualdade que existe, do outro lado do mundo e na esquina da minha casa. Quase todos os dias tenho vontade de xingar políticos quando vou trabalhar e presencio a falta de remédios no serviço público de saúde. Invariavelmente, tenho vontade de responder em tom de escárnio a quem vem dizer bobagens na minha rede social. Mas resolvi deixar pra lá.