Crônicas

Mundo louco: enquanto uns morrem de fome, outros ganham prêmio por ter o cachorro mais fashion

Mundo louco: enquanto uns morrem de fome, outros ganham prêmio por ter o cachorro mais fashion

Vai ver que é porque a gente aprende desde criança que o mundo, como eu disse e repito, não é mesmo pra ser justo. É feito pra ter gente de terno e gente sem sapatos, pra acariciar o coração de quem encontra amor e rasgar a alma de quem sofre o abandono, pra aplaudir os que não honram as calças de grife e humilhar os que deram o azar de flertar com a pobreza. Em algum manual de criação deve estar sacramentado que o mundo é pra ser, sim, desse jeito louco e desleal. Essa engenhoca composta por países marcados pela peste e por concursos que premiam o cachorro mais fashion.

Não consigo confiar em quem não sente ciúmes de mim

Não consigo confiar em quem não sente ciúmes de mim

Eu sempre confiei em pessoas ciumentas. E como toda união só se mantém na base da confiança, estava intencionada a juntar a fome com a vontade de comer. Gente ciumenta é confiável por vários motivos. O primeiro deles é que a sua atenção está integralmente voltada para você e não existe foco maior que você. Veja bem, não vamos confundir ciúmes com carência. O carente é pegajoso, cobrador de afeto. Já o ciumento não necessariamente é afetuoso. O seu diferencial está no poder de observação, e por assim dizer, na cadência com que os seus cinco sentidos giram ao seu redor.

O amor é contagioso, mas não se pega no cuspe

Declara o elemento, para os fins que se fizerem necessários, que, ao contrário do que se apregoa, a vida não começa aos 40, outrossim, principia quando a gente quiser que ela principie. Nessa altura do depoimento, ele lucubra: Somos livres para ir e vir, para amar e desamar, para levar uma vida inteira na flauta ou à caça do chamado futuro promissor. Ele completa o prolixo raciocínio, com ar de professor, reiterando que o passado o absorve e o presente lhe embrulha o estômago. Anda enojado dos seres humanos, os seus pares cotidianos, como eu, tu, ele, nós, vós, eles.

Às vezes é preciso enfiar o pé na jaca. Andar sempre na linha é um tédio

Às vezes é preciso enfiar o pé na jaca. Andar sempre na linha é um tédio

Se é prudente evitar excessos, evitemos o excesso de parcimônia também. Troquemos tacinhas por garrafas. Vez ou outra deixemos de lado palavras moderadas e soltemos palavrões em alto e bom som. Alguns domingos precisam de rodízio de pizza (e depois de dez fatias pode trazer a de banana sim). Em alguma tarde aleatória convém contrariar o chefe. Virar pra direita quando a placa indica a esquerda, sair da festa de manhã direto pra reunião com o diretor da empresa. Viajar de repente, vender a TV pra voar de balão, comprar sete blusas e três sapatos para se arrepender em seguida.