Clarice Lispector entrevista Pablo Neruda

Neruda é extremamente simpático, sobretudo quando usa o seu boné. Não brinca porém em serviço: disse-me que se me desse a entrevista naquela noite mesma só responderia a três perguntas, mas se no dia seguinte de manhã eu quisesse falar com ele, responderia a maior número. E pediu para ver as perguntas que eu iria fazer. Inteiramente sem confiança em mim mesma, dei-lhe a página onde anotara as perguntas, esperando Deus sabe o quê. Mas o quê foi um conforto. Disse-me que eram muito boas e que me esperaria no dia seguinte. Saí com alívio no coração porque estava adiada a minha timidez em fazer perguntas.

Com que sonha a geração Z?

Com que sonha a geração Z?

Diz-se que a geração Z é constituída pelos nascidos a partir dos anos 1990. Sua principal característica é a conectividade. São familiarizados à internet, aos smartphones e aparelhos afins, e não concebem a vida sem isso. Não. Essa turma não se interessa em sair para pescar. Eles são elétricos, inquietos, velozes, impacientes e se estressam noutro nível. São os nativos digitais. Podem fazer tudo pela tela de um telefone celular, inclusive ligar pra uma pessoa e dizer que sente saudades. Saudade: sentimento de gente fraca e desconectada? Com que sonha, afinal, a novíssima geração Z?

Mudo de opinião como quem muda de roupa. Se nem eu me entendo, como pode alguém saber tudo de mim?

Mudo de opinião como quem muda de roupa. Se nem eu me entendo, como pode alguém saber tudo de mim?

É inadmissível a ideia de que uma pessoa julgue me conhecer e tenha a autoridade para me definir e saber das minhas vísceras só porque ela sabe o meu signo. Me dá vontade de perguntar: Você não quer que eu passe um café, que te conte um pouco da vida? Não. Ela não quer. Já me classificou, me pôs na prateleira dos que são assim e assado. Não há o que eu faça ou fale ao meu respeito. Nada a fará mudar de opinião sobre mim.

Cuidado com o vazio de uma vida ocupada demais

Cuidado com o vazio de uma vida ocupada demais

Estou dispensada do mundo. Por essa razão, preciso fazer algo muito importante: absolutamente nada. Almejo ser inútil nesse dia. Escorregar do sofá pra cama, da cama pro sofá. Não quero malhar os glúteos. Quero enchê-los de gordura trans e Coca-Cola. Quero ficar sozinha, despenteada, andando maltrapilha pela casa, vestida com o pijama rasgado que minha tia me deu no natal de 1990.

A última entrevista de Cecília Meireles

A última entrevista de Cecília Meireles

“Tenho um vício terrível” — me confessa Cecília Meireles, com ar de quem acumulou setenta pecados capitais. “Meu vício é gostar de gente. Você acha que isso tem cura? Tenho tal amor pela criatura humana, em profundidade, que deve ser doença.” “Em pequena (eu era uma menina secreta, quieta, olhando muito as coisas, sonhando) tive tremenda emoção quando descobri as cores em estado de pureza, sentada num tapete persa. Caminhava por dentro das cores e inventava o meu mundo. Depois, ao olhar o chão, a madeira, analisava os veios e via florestas e lendas. Do mesmo jeito que via cores e florestas, depois olhei gente.”