Carta para alguém que espera

Carta para alguém que espera

Hoje voltou o frio. Veio como havia muito não vinha. Gelou o ar, esfriou o sofá da sala, resgatou meias, casacos e dores do fundo de uma gaveta que emperra como não quisesse abrir. Chegou sabe-se lá de onde, do pacífico, dos polos congelados, do sul do país. Não importa. Aqui faz frio. Em seu sopro fresco e úmido, esse frio há de aquecer os ímpetos de alguém. Há de animar as almas boas que se reúnem no calor de suas mesas, em volta de suas histórias contadas na fumaça perfumada das panelas bafejando decência. A mim, o frio me reencontra desprevenido e ridículo.

As histórias de cada um de nós passeiam pela vida afora

As histórias de cada um de nós passeiam pela vida afora

Logo no início da sessão ela teve vontade de falar do mar, da selvagem vitalidade que encontrava ao se entregar inteira às espumas. Vontade de esmiuçar as danças sinuosas nascidas das ondas, agitadas como serpentes, os polvos imensos, regentes das profundezas melódicas com seus tentáculos de maestros das águas. Ela quis comentar dos mares antigos, desbravados por navegadores desejosos por lamber novas terras recendendo à coragem e à sabedoria de conchas ancestrais.

Manias ou métodos de trabalho de 10 escritores clássicos

No livro “Rituales Cotidianos — Como Trabajan los Artistas” (Turner, 264 páginas), Mason Currey registra as manias ou hábitos de trabalho de mais de 160 criadores célebres. O jornal “ABC”, de Madri, arrola, no texto “Las manías de los grandes escritores”, o que chama de “manias” de dez prosadores. O livro, inédito no Brasil, explica como os escritores, de James Joyce a Philip Roth, escreveram suas obras-primas.

Por mim, linchamos o miserável e depois vamos à missa

Por mim, linchamos o miserável e depois vamos à missa

“O moleque ter sobrevivido foi obra de Deus”, disse o vendedor de loterias, que era crente feito o cão (se me permitem o chiste herético). Era uma daquelas tardes modorrentas na louca cidade, quando um caminhão desgovernado bateu num caminhão do Governo que bateu numa moto que conduzia um casal que morreu esmagadim na hora sem saber de quê nem pra quê. Não vou aumentar a estória, nem fazer piada com a dor alheia, mas contarei o fato a minha maneira: isto aqui é uma crônica baseada em fatos reais que mais parecem inventados.

Amor de verdade também acaba

Amor de verdade também acaba

Se preocupe não, moça. Não é você. Sou eu. Não tenho jeito pra esse negócio de amor. Acho lindo, acho lindo nas canções que você e eu amamos juntos. Mas na verdade, assim, no tempo duro de um dia depois do outro, o amor toca desafinado para mim, obrigatório, repetido, música com refrão meloso. Não é você, moça. Sou eu. É que eu não tenho muito que dar. Não rendo, não sei telefonar à noite, não sustento conversas sem assunto, diálogos sem tema. Não é você, linda, doce, cheia de graça. Sou eu. Vazio, triste, estranho.