Autor: Eberth Vêncio

Pula dentro dessa história e viaja comigo

Pula dentro dessa história e viaja comigo

“Eu opero melhor quando estou bêbado”. Todos naquela sala riram do comentário, exceto eu, que tinha os testículos nas mãos daquele exímio malabarista de semáforos, travestido como médico, prestes a fazer valer o ofício do canivete. Pra mim, ele não passava de um palhaço que, sequer, atendia pelo SUS.

Venham comigo ao cinema, antes que o diabo saiba que vocês estão mortos

Venham comigo ao cinema, antes que o diabo saiba que vocês estão mortos

Aquilo parecia uma intriga internacional contra a minha pessoa. Eu estava encurralado. Eu fora transformado num verdadeiro farrapo humano. A impressão que eu tinha era que nem todos os homens do presidente poderiam me tirar daquele inferno na torre. Era um tempo de violência. Já tinham jogado o Cidadão Kane e o Grande Gatsby pela janela indiscreta. Um corpo que cai do quarto andar mete medo em qualquer um. Éramos naquele apartamento bem mais do que três homens em conflito. Para ser exato: doze homens e uma sentença. Eu me sentia um estranho no ninho metido naquele verdadeiro sindicato de ladrões.

Como interpretar sonhos sem cair no ridículo

Como interpretar sonhos sem cair no ridículo

Enquanto eu dormia, minh’alma saiu pra dar um rolezinho e nunca mais voltou. Papai não gostou nada da brincadeira. Sou espirituoso. Ele é espiritualista. Às vezes me chama de espírito-de-porco. Ele cria e crê piamente que as almas dão sim os seus passeios enquanto estamos dormindo. Ninguém enxerga, mas lá estão elas, a rosetar pelo limbo. Por que motivo elas não permanecem ali, nem eu, nem ele saberíamos dizer. Eu, se fosse uma alma com hábitos noturnos, pessoalmente, ainda que pequena, ainda que valesse a pena, não voltaria para o meu corpo nem às custas de um despertador gritando na escrivaninha.

Eu sou feito de música

Eu sou feito de música

Eu sou feito de música. Mesmo quando estou dormindo, eu sou feito de música. Certa noite, sonhei que uma clave de sol perseguia-me pela pauta de uma partitura escura. A história toda foi uma espécie de ópera, um misto de drama e riso. Pode não parecer, mas o som é feito de luz, principalmente quando eu me sinto mais solitário, pra baixo, semínimo, breve, grave, pior que um violoncelo quando rompe uma das cordas. Não me recordo quando foi que rompi com a lira. Meus pensamentos andam pragmáticos demais, pesados demais, dignos da poesia concreta.