Autor: Eberth Vêncio

O corpo é uma droga

O corpo é uma droga

Eivado de hipocrisia, reencontrou-a no horário desmarcado. Um acaso dos diabos. Eram dois raios que volta e meia caíam sempre no mesmo lugar. A cama. Largavam-se na cama. Alargavam os horizontes. Zoneavam. A cama era como um campo de entrega, de colheita e de fastio. Ali se plantava. Ali se colhia. Escolheram qualquer colheita, o que viesse já estava de bom tamanho para além do estio.

Mais um otário à frente de seu tempo

Mais um otário à frente de seu tempo

Em tempos de meninice, bom mesmo era relevar, mas, eu não relevava. Certo mesmo era levar a vida na flauta, mas, eu não levava. Prendia o futuro com as mãos em ânsias de devaneio e ele sempre escapava entre os dedos. Nada mais natural. Em dado momento — degredo de mim mesmo — a descoberta da finitude humana fez-me reconhecer que, muitas das vezes, os momentos felizes aconteciam somente pelos lépidos olvidos do sofrimento.

Do que é mesmo que os cães estão rindo

Do que é mesmo que os cães estão rindo

João é um canídeo ordinário, sem raça, sem pulgas e sem boletos. É vê-lo sentado daquele jeito e enxergar graça do bichinho. Tenho uma certa queda por cães desclassificados com ar patético. Nota-se que o vira-latas abana o rabo de um lado para o outro, como se fora um espanador a varrer o assoalho da varanda. Ao abanar o rabo, os cães encontram uma forma explícita e direta de demonstrar gratidão, apreço, felicidade e compaixão.

Plano B para não falhar na Hora H à procura do Ponto G

Plano B para não falhar na Hora H à procura do Ponto G

Ninguém é obrigado a tolerar os chiliques dos outros. Em termos psiquiátricos, o editor do jornal para o qual eu escrevia os meus panfletos era um completo analfabeto funcional. Insensível como uma urna funerária, ou melhor, insensível como uma urna eletrônica, o sujeito nunca me pareceu uma companhia confiável. Aliás, não entendia patavina sobre o processo criativo dos seus articulistas. Arrematou aquela joça pagando uma mixaria num leilão de massas falidas.

O corpo é uma casa arrombada pelo tempo

O corpo é uma casa arrombada pelo tempo

O corpo é uma casa arrombada pelo tempo. Entra ano, sai ano, o controle esfincteriano vacila, se desajusta. O sangue coalha no seio varicoso de veias que perdem o molejo da elasticidade para adquirir a dureza plástica de um cano ou de um canudo. Mudo, o cérebro pensa que aquilo tudo é um ledo engano, fecha curto, passa pano e requenta a marmita encefálica com papas de neurônios, sob a tempestade de sinapses chocantes dos axônios desencapados.