“Noite no Paraíso” é uma narrativa que mergulha nas profundezas de uma tragédia moderna, evocando ecos das obras de Shakespeare, como “Hamlet” ou “Romeo and Juliet”. Desde o início, o espectador é conduzido a uma atmosfera densa e carregada, onde o desfecho trágico é inevitável. No universo dos filmes de máfia, o final feliz é uma raridade, e este não foge à regra. Além disso, quando se trata de uma produção asiática, a expectativa por sequências de combate magistralmente coreografadas é alta, dado o inigualável domínio que essas culturas têm sobre as artes marciais.
Tae-gu, interpretado por Tae-goo Eom, é um mafioso que, após anos imerso no mundo do crime, decide mudar de vida. Seu desejo é simples: abandonar a violência para cuidar de sua irmã gravemente enferma e de seu sobrinho. No entanto, o destino não lhe concede essa trégua. Sua família é brutalmente assassinada por inimigos, e a sede de vingança o consome. A retribuição de Tae-gu é rápida e implacável, mas suas ações provocam a ira de seu próprio clã, forçando-o a fugir para a isolada Ilha de Jeju. Lá, ele cruza caminhos com uma jovem enigmática e sombria.
O primeiro encontro entre Tae-gu e Jae Yeon, vivida por Jeon Yeo-bin, é um evento marcante e peculiar. Tae-gu é despertado pelo som de tiros ao amanhecer. Ao investigar, descobre Jae Yeon praticando tiros com precisão cirúrgica, destruindo uma fila de garrafas dispostas sobre um tronco. Quando ela, de repente, aponta a arma para a própria cabeça, ele se prepara para o pior. Tentando intervir, ele testemunha um momento de tensão máxima que termina em um anticlímax: a arma está descarregada. Este episódio não só captura a atenção de Tae-gu, mas também estabelece uma conexão entre os dois, revelando que ambos carregam uma dor profunda.
A aproximação entre Tae-gu e Jae Yeon é inevitável, e ele logo descobre que a jovem, além de sofrer de uma doença terminal, é impulsionada por um desespero que beira o suicida. A trágica coincidência de suas vidas se intensifica ao descobrirem que a família de Jae Yeon também foi dizimada, e que o envolvimento de seu tio com o submundo do crime foi a causa dessa perda devastadora. Jeju, que parecia um refúgio, se torna um campo minado, onde o passado criminoso de ambos ameaça explodir a qualquer momento.
A narrativa então se transforma em uma fuga desesperada, uma caçada implacável onde Tae-gu e Jae Yeon se tornam os alvos de inimigos implacáveis. Entre cenas de perseguição, violência e tensão crescente, surge um vínculo emocional entre eles, um romance que permanece não consumado, mas palpável.
Os espectadores de “Noite no Paraíso” são levados por uma jornada de ação implacável, repleta de cenas intensas de combate, tortura e morte. O filme, que mais se assemelha a uma descida aos infernos do que a uma noite paradisíaca, é um turbilhão de emoções, onde a sobrevivência contra os piores elementos do crime organizado é uma batalha constante. Apesar da natureza sombria e introspectiva dos protagonistas, Tae-gu e Jae Yeon, há algo neles que nos atrai – uma espécie de doçura silenciosa que humaniza suas figuras marcadas pela tragédia.
Sem revelar detalhes cruciais, é impossível não mencionar que uma das cenas finais do filme ecoa a morte de Júlio César, esfaqueado por seus próprios aliados, reforçando o clima de traição e fatalidade que permeia toda a trama.
“Noite no Paraíso” é um filme que transcende o gênero de ação. Com sua estética cuidadosa e narrativa poderosa, é uma obra que, embora repleta de violência, também se destaca por sua beleza poética e dramática. Um filme que prende o espectador do começo ao fim, oferecendo muito mais do que lutas e sangue, mas uma experiência cinematográfica completa e inesquecível.
Filme: Noite no Paraíso
Direção: Park Hoon-jung
Ano: 2020
Gênero: Ação / Drama
Nota: 8/10