Não é de hoje que o cinema manifesta seu fetiche para com bonitões meio perdidos, dissipando a vida de bar em bar, bebendo muito, vivendo pouco, mas preservando aquela altivez natural, certos talvez de que alguma solução mágica há de se anunciar. O argentino Diego escolhe o pub de Guadalupe, a Lu, para afogar as mágoas, e então “Tangos, Tequilas e Algumas Mentiras” começa a dizer a que veio. O remake de “Ocho Apellidos Vascos” (2014), a divertida comédia romântica do madrilenho Emilio Martínez-Lázaro, agora sob o ponto de vista do mexicano Celso R. García, consegue dar sentido às cenas quase frenéticas que passam do envolvimento fortuito e displicente de Diego e Lu a um idílio com espaço para deambulações filosóficas e autoanálises de um e da outra. Diego, um playboy perigosamente desprendido que parece sempre disposto a uma aventura — comercial, inclusive — e Lu, uma mitômana inveterada que precisa com urgência de um choque de realidade, deveriam ser como água e azeite, mas o bem-costurado roteiro de Borja Cobeaga, Marco Lagarde e Diego San José transformam-nos num casal de anúncio de margarina, e ai de quem se meta entre os dois.
García equilibra seu filme entre a dupla de protagonistas e as figuras que orbitam em seu entorno. No caso de Lu, na verdade ela não é a proprietária do estabelecimento em cujo balcão conhece Diego, como diz a todo mundo, mas apenas a sócia minoritária, perigando ser expulsa do negócio por não efetuar a transferência da quantia que lhe cabe. Recorrendo a boa dose de charme, vai conseguindo ficar, sem nunca se conter e soltando uma ou outra potoca. Quando ela bravateia que já teve namorados bem mais atraentes que o marmanjo meio choroso da outra ponta do balcão, Tatiana, a amiga interpretada por Pilar Santacruz, lhe dá um ultimato: caso Lu o faça apaixonar-se por ela, estará livre da dívida, mas se levar uma fora, voltará a ser apenas a garçonete.
O que se segue é uma espiral de encontros e desencontros dos antimocinhos de David Chocarro e Cassandra Sánchez Navarro, começando pela primeira noite que passam juntos. Ela acorda sozinha no quarto de hotel dele, e aos poucos o diretor esclarece que Diego está na Cidade do México para tentar abrir uma filial de sua livraria sediada em Buenos Aires, mas as negociações não avançaram porque ele só conseguia pensar na noiva, que terminara tudo por mensagem.
Lu, por óbvio, nem pensa em confessar que só jogou-se nos braços do livreiro para tentar obter seu quinhão no bar de uma vez por todas, mas começa a se encantar de verdade, e nesse momento entram em cena Martina, a mãe controladora e xenófoba de Diego, e Tona, parente de uma amiga, um ator aposentado que vai lhe passar alguns truques sobre como emular o sotaque portenho e conquistar a possível futura sogra — os roteiristas não explicam direito como a vegana Lu encara o fato de Martina ser a diretora executiva do frigorífico que herdou do pai de Diego, mas quem se importa? Soledad Silveyra e Emilio Guerrero juntam-se a Chocarro e Navarro para dar ainda mais graça às blagues nonsense e politicamente incorretas de “Tangos, Tequilas e Algumas Mentiras”, que é exatamente isso: ritmado, refrescante e vesano na medida.
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