15 milhões de vezes em 5 dias: filme com Viola Davis e Antony Starr lidera o Top 1 mundial do Prime Video Divulgação / Amazon Prime Video

15 milhões de vezes em 5 dias: filme com Viola Davis e Antony Starr lidera o Top 1 mundial do Prime Video

Há uma estranha beleza no desconcerto causado por filmes que não disfarçam seu desejo de parecer maiores do que suas ideias comportam. “G20”, sob a direção de Patricia Riggen, é exemplar nesse aspecto: encena a ocupação de uma cúpula internacional por terroristas pseudo-ideológicos enquanto empunha uma estrela como Viola Davis no papel de uma presidente dos Estados Unidos que, de vestido rasgado e metralhadora em punho, resolve sozinha a diplomacia à base de golpes e tiros. A premissa, frágil desde o esboço, recorre a camadas de verniz técnico e moral para camuflar sua condição real — um produto de streaming desenhado para trafegar entre a caricatura de ação e o fetiche contemporâneo da mulher forte que triunfa em terrenos tradicionalmente masculinos. Em meio a essa ambiguidade, o filme revela muito mais sobre a indústria que o gerou do que sobre os conflitos que pretende explorar.

O que impede “G20” de ruir sob o próprio peso é, paradoxalmente, o contraste gritante entre a superficialidade da proposta e a densidade que Viola Davis confere a qualquer papel. Ao interpretar Danielle Sutton — veterana de guerra, mãe solo e comandante em chefe —, Davis injeta gravidade em um roteiro que raramente a acompanha. O espectador atento verá ecos distantes de “A Mulher Rei”, mas sem o rigor dramático ou a complexidade histórica. Em vez disso, temos uma sequência de eventos costurados por frases de efeito e pancadaria estilizada, onde a presidente salva o mundo com a mesma destreza com que se esquiva de convenções narrativas. O que deveria ser cômico torna-se cativante: Davis transita entre a contenção institucional e a brutalidade coreografada com uma fluidez que, não fosse ela, soaria risível. Ainda que esteja menos presente na tela do que o marketing sugere, sua sombra paira sobre cada movimento da narrativa.

Essa fusão entre espetáculo e símbolo é explorada com um certo cinismo pelo roteiro assinado por Logan Miller, Caitlin Parrish e Erica Weiss, que aposta em um cenário geopolítico genérico e volátil como pretexto para acrobacias morais e digitais. Os antagonistas, liderados por um Antony Starr competente e previsível, personificam o arquétipo do inimigo globalizado: militam por uma nova ordem monetária baseada em criptomoedas, invocam discursos anticapitalistas e executam sua revolta com a precisão de um algoritmo malicioso. Nesse teatro de intenções mal explicadas, surge Serena, a filha da presidente, interpretada com vitalidade por Marsai Martin, cuja breve subtrama insinua um dilema real — o uso de moedas digitais para combater a fome — que logo se dissolve entre explosões e perseguições. Há inteligência nesse fragmento, mas o filme prefere convertê-lo em ruído de fundo.

Mesmo sob a ótica generosa de um entretenimento escapista, “G20” sofre do mesmo mal que assola boa parte das produções concebidas para o consumo instantâneo: a anestesia do olhar. Cada cena externa parece filtrada por uma névoa digital, as falas foram escritas como se destinadas a uma plateia distraída com o celular, e a montagem prioriza o ritmo sobre a verossimilhança. Ainda assim, Riggen consegue manter a coerência visual e espacial das sequências de ação, o que já a distancia da mediocridade técnica que define o grosso do gênero. Há uma lógica interna nos combates, uma atenção mínima à topografia da violência encenada que impede o colapso completo da credibilidade. Mas seria desonesto ignorar que o filme aposta deliberadamente no absurdo, como na cena em que Sutton — em plena gala — se desfaz do vestido para chutar rostos com mais liberdade. É o tipo de cena que sabe o quanto é ridícula e, por isso mesmo, funciona.

O que resta, ao final, é uma espécie de pacto silencioso entre quem dirige, quem atua e quem assiste. Ninguém ali acredita de verdade no projeto como potência dramática, mas todos aceitam a fantasia como rito necessário. Viola Davis, ao emprestar sua reputação a um produto que está claramente abaixo de sua estatura, não trai sua trajetória; ela a amplia. Há algo quase político em vê-la se apropriar de um papel que, mesmo escrito com simplismo, ecoa promessas contemporâneas de representação e poder. O gesto de quebrar o pescoço de um mercenário com uma metralhadora não é apenas coreografia: é um comentário visual sobre quem está autorizado a ocupar o centro da narrativa. E se “G20” fracassa como alegoria política ou cinema de ação refinado, triunfa momentaneamente como espetáculo de inversão simbólica. Não pela trama, não pela direção, e certamente não pelo roteiro. Mas porque há, no meio da tempestade digital, uma atriz que encara o absurdo com a seriedade de quem sabe o que está em jogo.

Filme: G20
Diretor: Patricia Riggen
Ano: 2025
Gênero: Ação/Thriller
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★