O amor mais impossível do cinema — e que ainda parte o coração de milhões — está de volta na Max Divulgação / Warner Bros.

O amor mais impossível do cinema — e que ainda parte o coração de milhões — está de volta na Max

O amor pode ser como os perfumes, que evolam sem que se perceba, conquanto sempre deixem seu rastro de fragrâncias ora adocicadas, ora cítricas, quase azedas; como as cores, luminosas feito o sol numa tarde de verão, ou tão lúgubres e escuras que tingem de morte o que deveria sembrar apenas o existir mesmo. Dias de caos dão lugar às noites frias em que a cama parece um deserto branco de lençóis que a fadiga do corpo ajuda a vencer. No entanto, sempre chega a hora em que a solidão renuncia a suas eventuais delicadezas e põe de fora as garras, sabendo exatamente por onde começar seu ataque. Nas comédias românticas as diferenças culturais, aquelas que carregamos conosco aonde quer que possamos ir, continuam a pesar, claro, mas só até certo ponto, e em “A Casa do Lago” o argentino Alejandro Agresti dribla boa parte dos clichês do gênero a fim de defender que o amor, o verdadeiro amor, não se limita ao tempo cronológico. O roteiro de David Auburn, Eun-Jeong Kim e Ji Na Yeo frisa as idas e vindas de um homem e uma mulher que dividiram em épocas distintas a tal casa do lago do título, trocando uma montanhas de estranhíssimas correspondências sem ter a mais pálida ideia sobre se ficariam juntos.

A vida é um intervalo curto entre nascer e morrer, durante o qual perseguimos respostas para questões as mais complexas, as mais incômodas, sabendo que não iremos encontrá-las — ou, pior, pensaremos tê-las encontrado, até que, muito tempo depois, teremos de admitir que nos precipitamos. Todavia, de qualquer forma, cada um toma sua cruz e busca sentido para a caminhada, achando uma ou outra mão amiga, umas vacilantes, outras mais firmes, e o medo e a esperança muitas vezes acabam tornando-se uma coisa só.

Talvez seja por isso que tanta gente tem recorrido a métodos, digamos, heterodoxos quando se trata de procurar companhia para um fim de semana na praia ou garantir alguma satisfação numa noite chuvosa, o que fomenta uma imensa cornucópia de perguntas, a começar por uma óbvia: quando foi que fomos deixando que nossa humanidade, maravilhosa em suas imperfeições, se tornasse um peso diante das facilidades da vida pós-moderna? É por aí que Agresti faz seu longa andar, apostando nos desempenhos de um par de queridinhos de Hollywood. “A Casa do Lago” não tem nada de mais, a não ser por Keanu Reeves e Sandra Bullock fazerem dessa uma história sobre um amor impossível que, bravo, resiste ao afastamento físico e ao que a própria vida reserva-lhe. Alex Wyler e Kate Forster são o anticasal que parece encontrar-se apenas nos sonhos de um e da outra, como que perdidos em suas vontades. O diretor explora essa ideia até o desfecho, sem grandes reviravoltas, mas com os dois pés no sobrenatural. Exatamente como a mais humana das emoções.

Filme: A Casa do Lago
Diretor: Alejandro Agresti
Ano: 2006
Gênero: Comédia/Drama/Fantasia/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.