“O Brutalista” entra com todo o merecimento na galeria de épicos do cinema, e é preciso fôlego extra para chegar ao fim dos 215 minutos de uma história cheia de reviravoltas, detalhes, proposições, beleza, mas uma beleza que repudia a obviedade e impõe-se pelo vigor. Brady Corbet e a corroteirista Mona Fastvold tecem críticas ora pertinentes, ora ingênuas ao capitalismo tendo por pano de fundo a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que expulsa um homem de sua terra natal e o força a sair à procura um novo lugar para chamar de seu, pouco importa onde, sem nenhuma garantia de que o iria encontrar. Esse homem, László Tóth, vai parar, claro, nos Estados Unidos, mais precisamente em Nova York, e a partir então o filme ganha cores, movimento, estrutura, dançando conforme a estranha música que o compositor Daniel Blumberg cria para ele. Corbet, a propósito, reúne talentos diversos em torno de seu longa, ancorado em alguém que não existiu, mas que reúne arquitetos como Marcel Breuer (1902-1981), Paul Rudolph (1918-1997) e Louis Kahn (1901-1974), responsáveis por instantes de genuína fruição estética que perpetuam-se no tempo, como a Igreja de São Francisco de Sales em Norton Shores, Michigan, e o edifício-sede da Unesco em Paris.
Corbet e Fastvold recorrem a “Marcel Breuer and a Committee of Twelve Plan a Church: A Monastic Memoir” (“Marcel Breuer e um comitê de doze planejam uma igreja: um livro de memórias monásticas, em tradução literal”; 2011), de Hilary Thimmesh (1928-2019), para compor muitos dos diálogos do filme e provar que poderia mesmo László ter ganhado o mundo caso tivesse existido fora da tela. No que toca a “O Brutalista”, não haveria ninguém mais adequado para dar vida a László que Adrien Brody; como em “O Pianista” (2002), de Roman Polanski, aqui Brody também encarna um artista atormentado, que chega à América escapando do Holocausto, mirando a Estátua da Liberdade de cabeça para baixo, numa sacada genial do editor Dávid Jancsó e do diretor de fotografia Lol Crawley, metáfora de como estava sua vida naquele momento. Acostumado a trabalhar com formas desproporcionais que em sua falta de harmonia erigem titânicos monumentos ao lirismo, não seria a disforia da paisagem o bastante para afastar László ou tirar-lhe a coragem, predicado que vai e volta na composição de Brody, vencedor do Oscar de Melhor Ator em 2025, 22 anos depois de sua primeira consagração pela Academia pelo trabalho com Polanski.
A sorte começa a sorrir para László, o poeta do concreto armado — um dos fundamentos do tal brutalismo —, quando ele conhece Harrison Lee Van Buren, um excêntrico milionário que inicialmente quer contratá-lo para reformar sua biblioteca, mas acaba dando vazão ao sonho de construir um centro comunitário em homenagem a sua recém-falecida mãe. A química entre Brody e Guy Pearce conduz o filme por uma abordagem plena de estranhamento, levado a um extremo de violência numa certa passagem na iminência do final. Mas longe de estragar a magia que foi se erguendo do chão no decorrer de três horas do mais sofisticado cinema.
★★★★★★★★★★