Comédia romântica ignorada pela crítica e pelo público, é um dos melhores romances da história da Netflix Divulgação / Netflix

Comédia romântica ignorada pela crítica e pelo público, é um dos melhores romances da história da Netflix

Há filmes que revelam desde o primeiro minuto que não estão interessados em provocar, reinventar ou surpreender. Estão ali para ocupar espaço, preencher a tela com fórmulas conhecidas e personagens que simulam complexidade sem jamais atravessá-la. “Quando Nos Conhecemos” é exatamente esse tipo de produção: um experimento de ficção que se anuncia audacioso — um romance temperado com viagens no tempo — mas que se dissolve em uma rotina dramatúrgica previsível, onde cada tentativa de humor ou emoção parece domesticada por algoritmos e testada contra a média do desinteresse.

A ideia de um protagonista que retorna obsessivamente ao passado para reescrever um único encontro amoroso poderia, nas mãos certas, servir de metáfora potente sobre idealização, livre-arbítrio ou amadurecimento afetivo. No entanto, o filme restringe sua ambição a um único plano: a frustração masculina diante da rejeição e a ilusão de que manipular o tempo equivale a manipular sentimentos alheios. A narrativa gira em torno de Noah, um pianista ressentido com o abraço que recebeu no lugar de um beijo, e transforma sua dor de ego em jornada heroica. Nada é mais emblemático da superficialidade contemporânea do que um personagem que, ao ganhar a chance de redesenhar o passado, escolhe apenas tentar convencer uma mulher de que ele “merece” ser amado.

Essa limitação não é acidental, mas resultado direto de um roteiro que se contenta em repetir as mesmas fórmulas, esperando que a repetição traga o efeito de profundidade. As múltiplas linhas do tempo — em que Noah ora é gentil, ora cafajeste, ora bem-sucedido — não oferecem contrapontos reais, apenas variações mecânicas de um mesmo erro: o foco exclusivo em si mesmo. A cada tentativa, ele reencontra não apenas Avery, mas também os próprios limites de sua visão de mundo. E, em nenhum desses retornos, parece haver espaço para que o personagem questione o que significa, de fato, amar alguém — ou ser digno desse amor.

O que mais chama atenção é a ausência de qualquer senso de urgência ética ou curiosidade histórica por parte do protagonista. A viagem no tempo se reduz a um instrumento de sedução, como se o mundo em volta não existisse. Não há indignação, não há senso de missão, não há sequer uma fagulha de consciência temporal. Em um tempo narrativo que se desdobra às vésperas de transformações sociais, tecnológicas e políticas significativas, o personagem central opta por desperdiçar todas as oportunidades históricas em nome de uma obsessão pessoal medíocre. É como se o filme dissesse que a fantasia mais ousada de sua geração fosse apenas reescrever o roteiro de um beijo mal dado.

Mesmo quando a narrativa tenta, tardiamente, redirecionar sua bússola emocional — insinuando que o verdadeiro par ideal talvez fosse Carrie, e não Avery — essa guinada soa mais como uma rendição que como revelação. Não há ruptura genuína, apenas um deslocamento conveniente dentro dos limites do próprio jogo. A falta de tensão dramática é agravada por diálogos que evitam qualquer ambiguidade e por uma construção de personagens que se apoia no carisma dos atores em vez de na densidade das relações. A química que move a história não nasce das interações, mas da expectativa de que o público a aceite por inércia.

O que “Quando Nos Conhecemos” revela, no fundo, não é apenas a crise criativa de uma narrativa presa ao passado — literal e metaforicamente — mas também a segurança anestésica com que certos filmes são produzidos sob o guarda-chuva das plataformas de streaming. A lógica do “conteúdo suficiente” substitui a ideia de criação significativa. Filmes como esse não nascem para marcar o espectador, mas para acompanhá-lo passivamente, como trilha de fundo enquanto ele navega pelo celular. E é precisamente essa falta de ambição — artística, crítica ou emocional — que o torna tão esquecível.

Não é a ideia de viagem no tempo que cansa. É o uso que se faz dela. A fantasia de poder alterar o passado permanece fascinante, mas não quando ela serve apenas para justificar o narcisismo. Há algo profundamente inquietante em uma história que transforma a manipulação do tempo em uma metáfora para insistência afetiva, como se a persistência do desejo bastasse para reconfigurar a realidade. O que “Quando Nos Conhecemos” ignora é que o amor, para existir de verdade, só pode nascer no tempo presente — aquele onde não se controla o outro, nem se volta atrás.

Filme: Quando Nos Conhecemos
Diretor: Ari Sandel
Ano: 2018
Gênero: Comédia/Fantasia/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★