O filme adorável no Prime Video que pode mudar sua forma de ver a vida — dê esse presente a si mesmo e assista Divulgação / Woods Entertainment

O filme adorável no Prime Video que pode mudar sua forma de ver a vida — dê esse presente a si mesmo e assista

Certos vínculos só se revelam sob a sombra do que foi destruído. A morte, nesse contexto, não é um ponto final, mas o estopim que aciona aquilo que estava suspenso, mal resolvido ou convenientemente silenciado. Quando um homem que amou duas mulheres morre, deixando em aberto não apenas as finanças, mas também uma herança emocional cheia de fraturas, surge a pergunta: como as partes coladas com rancor e vergonha podem conviver na mesma moldura?

Há algo de incômodo — e, por isso mesmo, instigante — na forma como a diretora Aisling Chin-Yee retrata esse universo de tensões essencialmente femininas. Ainda que o viés da narrativa se incline fortemente a partir do olhar de suas quatro protagonistas, o que se coloca em xeque não é uma simples exaltação da experiência da mulher, mas sim a complexidade de existir dentro e fora dos papéis sociais que ainda as aprisionam. Ao abordar um recorte muito específico e pouco representado — mulheres de classe média com uma história de dependência afetiva e emocional — o filme não busca abraçar todas, mas iluminar aquelas cujas trajetórias são quase sempre ignoradas.

O curioso é que, embora o eixo dramático seja sustentado por Cami, Rachel, Aster e Talulah, o enredo gira em torno de Craig, o grande ausente. Seu legado é uma coleção de feridas abertas: uma casa hipotecada, duas filhas de mães diferentes e ressentimentos cuidadosamente nutridos. E, no entanto, ele permanece um espectro sem rosto, sem fala — um retrato na parede, símbolo de tudo o que foi imposto, negligenciado ou omitido. Seu silêncio póstumo ressoa alto, obrigando as sobreviventes a lidarem não apenas com o luto, mas com a responsabilidade de desatar os nós que ele deixou.

Não há gesto generoso que não seja contaminado por segundas intenções, e isso confere às interações uma acidez que impede qualquer leitura apaziguadora. Cami oferece abrigo a Rachel, mas seu semblante rígido, marcado por uma interpretação meticulosa de Heather Graham, denuncia que por trás do gesto há um teste: até onde a outra suportará a humilhação sem se desmontar? Rachel, interpretada com voltagem emocional por Jodi Balfour, não quer esmolas, tampouco sabe lidar com a ruína iminente. Ambas desfilam em um campo minado onde cada frase é armada como possível ataque, cada silêncio é uma provocação em espera.

O roteiro de Alanna Francis é deliberadamente desconfortável. Ninguém ali é inocente, e as dores não se esgotam nos gestos de aparente reconciliação. As personagens se debatem entre a tentação de alimentar antigos rancores e a necessidade brutal de adaptação. Aster e Talulah, as filhas, orbitam esse universo com uma clareza desconcertante: talvez por ainda não terem sido moldadas por amarguras acumuladas. E é nesse espaço juvenil — onde ainda se pode aprender a desapegar de ódios herdados — que nasce a única possibilidade de vínculo genuíno.

Mas a tal sororidade — frequentemente romantizada como se bastasse compartilhar o gênero para construir pontes — aqui é posta à prova de forma crua. Só se insinua quando todas já se enfrentaram o suficiente para cansar da guerra. O entendimento não vem por empatia instantânea, e sim pelo desgaste mútuo, pelo cansaço de alimentar mágoas. O que se forma entre Cami e Rachel não é uma amizade; é um pacto silencioso de sobrevivência emocional, tecido nas brechas deixadas por um homem que nem sequer se deu ao trabalho de resolver seus compromissos antes de partir.

Aos poucos, o filme desmonta a ideia de que o sangue ou o passado bastam para estabelecer laços duradouros. A aproximação entre Aster e Talulah nasce justamente da recusa em continuar alimentando o ressentimento legado por Craig. Se há uma centelha de redenção, ela pertence às crianças que escolhem construir outra memória — uma que não dependa do homem ausente, mas da decisão corajosa de não repetir suas escolhas.

E assim, ao contrário do que se poderia esperar de um enredo sobre luto, o que permanece não é a memória do que foi perdido, mas a ousadia do que pode ser reinventado a partir dos escombros. Não é o sangue que define uma família, tampouco a dor que define uma mulher. É a decisão, ainda que vacilante, de não perpetuar o erro herdado. E quando essa decisão vem, mesmo que tarde, o silêncio do retrato na parede se torna irrelevante.

Filme: Amigas Improváveis
Diretor: Aisling Chin-Yee
Ano: 2019
Gênero: Drama
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★