Matt Damon e Brad Pitt no melhor mistério de ação que você vai ver esta semana no Prime Video Divulgação / Warner Bros.

Matt Damon e Brad Pitt no melhor mistério de ação que você vai ver esta semana no Prime Video

Existe algo mais sedutor do que um truque que não precisa ser explicado? A narrativa de “Treze Homens e um Novo Segredo” dispensa a lógica como centro gravitacional e, em seu lugar, instala o encanto de uma engrenagem que reluz por si mesma. O filme não se interessa em conduzir o espectador até as respostas, mas em fazer parecer que todas elas já estavam lá — visíveis, ainda que inalcançáveis. Steven Soderbergh não constrói suspense, ele coreografa charme. A engenhosidade está menos no “como” e mais no “quão bem disfarçado foi o truque”. O vocabulário da fraude, com suas frases cifradas e manobras coreografadas, assume o papel de idioma oficial, e quem compreende seus ritmos entende que ali, o raciocínio linear seria um obstáculo. O roteiro não age como solucionador de enigmas, mas como anfitrião de uma celebração: dirige a luz, aponta a música e aposta tudo no magnetismo de seus jogadores.

Nesse universo, a virtude se redefine. Não se trata de bondade, mas de aplicar a esperteza contra o oponente certo — alguém que tenha exagerado a própria importância. Willy Bank, revestido de bronze artificial e vaidade em estado sólido, representa esse excesso. Sua traição a Reuben Tishkoff não viola apenas um acordo empresarial, mas transgride um código não escrito de lealdade entre trapaceiros. O que se instala, então, é uma revanche alimentada por orgulho e afeto, mais próxima de uma lição de estilo do que de um ajuste de contas. Danny Ocean e seus cúmplices operam como guardiões de um legado: punir quem tentou vencer sem elegância. Não por justiça formal, mas por um senso estético de retaliação, onde o erro maior não é fraudar, mas fazê-lo sem graça. O conflito é travado com abalos sísmicos simulados, artimanhas sindicais e dispositivos hackeados — um campo de batalha onde a sagacidade é a principal arma.

O filme não se contenta com a repetição de fórmulas visuais ou narrativas. Soderbergh ergue um espetáculo meticulosamente estilizado, em que os excessos — de figurinos a planos sobrepostos — não atrapalham, mas compõem uma linguagem própria. Cada plano parece desenhado para afirmar: estamos fora da realidade e é melhor assim. Os nomes estapafúrdios dos planos, as soluções mirabolantes, os disfarces quase caricatos — nada é gratuito. É como se o absurdo fosse o preço pago para manter vivo um pacto com a ludicidade. O exagero não desestabiliza o filme; ao contrário, cimenta sua proposta. Tudo está a serviço de uma lógica dramatúrgica que não quer convencer, mas entreter com rigor. A comédia não atua como válvula de escape, mas como combustível da máquina que move a narrativa em sua própria frequência.

O motor secreto dessa máquina é a simbiose entre seus protagonistas. George Clooney e Brad Pitt transitam entre as cenas com a fluidez de quem já não precisa provar nada. Não há pirotecnias emocionais entre Ocean e Rusty — há silêncios que dizem mais, há olhares que precedem as ações. A ligação entre os dois personagens não é forjada por diálogos, mas pela sugestão de um passado irredutível. Juntos, encarnam uma Vegas que já evaporou: a dos cassinos esfumaçados, do jazz insinuante, dos truques analógicos. A cidade em que se movimentam hoje, repleta de espetáculos verticais e fachadas envernizadas, é uma lembrança deformada daquilo que um dia foi estilo. O filme habita esse intervalo entre a nostalgia e a reinvenção, onde cada golpe é também uma elegia disfarçada ao que foi perdido no brilho novo demais do presente.

Na multidão de personagens, há uma precisão estratégica que impede o colapso. Ellen Barkin, como a executiva cuja autoridade repousa sobre padrões visuais duvidosos, não está ali só como peça de antagonismo funcional. Sua queda simboliza a falência de uma estrutura onde o poder feminino é estetizado, mas não legitimado. Linus, outrora aprendiz, encontra sua afirmação ao arquitetar essa derrota — não como herói, mas como alguém que finalmente compreendeu a gramática do jogo. Terry Benedict, agora cúmplice, encarna a fluidez moral de um universo onde alianças mudam conforme a direção do vento — ou da aposta. Até a inteligência artificial do sistema Greco é derrubada por criatividade, como se o roteiro quisesse reiterar que, em última instância, é a engenhosidade humana que ancora qualquer espetáculo que se pretenda memorável.

Não é a fortuna acumulada que importa, mas a reafirmação de um código de conduta onde o engenho é sinônimo de dignidade estética. “Treze Homens e um Novo Segredo” não quer que se acredite em sua verossimilhança, mas que se deseje fazer parte de seu mundo — por um breve tempo, ser cúmplice de uma ilusão tão bem executada que deixa de importar se era plausível. Há algo quase infantil — no melhor sentido — nesse pacto silencioso com o público. Ele nos relembra que, talvez, exista valor real em desafiar a previsibilidade com charme, em vestir um terno impecável e tentar uma última jogada apenas pelo prazer de jogá-la. E é nessa suspensão elegante das regras que o filme encontra seu triunfo mais duradouro.

Filme: Treze Homens e um Novo Segredo
Diretor: Steven Soderbergh
Ano: 2007
Gênero: Crime/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★