A sucessão de combates que molda a vida de Brandon Beckett parece não encontrar um ponto final. O atirador vivido por Chad Michael Collins permanece encurralado — não fisicamente, mas emocionalmente —, imerso em missões que corroem mais do que o corpo: desidratam o espírito. Em “O Atirador: Missão Secreta”, capítulo nono de uma franquia que insiste em sobreviver ao próprio desgaste, o que se vê não é exatamente uma renovação, mas uma reacomodação do cansaço. A trajetória iniciada em 1993 por Thomas Beckett (Tom Berenger), sob direção de Luis Llosa, reverbera agora por meio do filho, que se lança contra um consórcio de predadores sociais enquanto o diretor Oliver Thompson tenta abrir frestas no interior opaco de seu protagonista. Nessa engrenagem de ressentimentos, o idealismo dá lugar a um código de lealdades corroído, e o heroísmo se desfigura na arena de burocracias traiçoeiras e ameaças internas que tornam a missão quase caricata de tão desesperançada.
Não há descanso nem glória na rotina de um sniper, apenas a permanência provisória em meio ao caos. Brandon, perito em antecipar a morte e sobreviver ao inverossímil, vê-se lançado contra uma rede internacional de tráfico humano, apenas para descobrir que os verdadeiros entraves não se escondem nas sombras do inimigo, mas nos corredores institucionais onde deveria haver respaldo. Quando elimina, com precisão inquestionável, um dos chefes da máfia sexual nos Estados Unidos, o retorno que recebe da CIA não é gratidão, mas censura. A cena que se segue, em que Gabriel Stone (Dennis Haysbert) o adverte com frieza, encarna a dissonância entre a ética operacional e a política de gabinete. Thompson, ao lado de Michael Frost Beckner e Crash Leyland, roteiriza o impasse com ambivalência: a violência de Brandon parece ora redentora, ora condenável, enquanto a narrativa oscila entre a contenção tática e a explosividade emocional.
O que resiste, nesse mar de contradições, é uma inquietude que ultrapassa o clichê do soldado calejado. Collins acentua, com nuances discretas, um Brandon menos rígido do que aparenta, particularmente nas interações com o inflexível Zero (Ryan Robbins). A tensão entre os dois não serve apenas como catalisador dramático: é um espelho onde se reflete o dilema moral de uma guerra subterrânea, onde os algozes vestem ternos bem cortados e ocupam cargos estratégicos. A prisão de Harvey Cusamano, funcionário federal envolvido com figuras do submundo que operam sob a fachada de respeitabilidade, simboliza essa perversão institucionalizada. A história contada aqui não surpreende em sua estrutura, mas oferece, ainda assim, lampejos de contundência, especialmente ao dar rosto à banalidade do mal — aquele que não ruge, mas sussurra acordos em salas acarpetadas.
“Missão Secreta” funciona, portanto, como um exercício de resistência estética e narrativa: a tentativa de manter vivo um enredo cuja ossatura já conhecemos bem. Ainda assim, há algo a ser dito sobre o modo como a série, mesmo em sua previsibilidade, busca um tipo de inquietação menos superficial. O reencontro com filmes anteriores da saga parece inevitável, não por saudosismo, mas por contraste. Lá atrás, havia mais suspense e menos formalismo; aqui, o que resta é a dureza operacional e o peso das escolhas feitas entre silêncios e disparos. Beckett continua mirando alvos distantes, mas é o vazio ao redor que o ameaça com mais ferocidade. E talvez seja exatamente isso que sustente seu fôlego: não a vitória sobre o inimigo, mas a sobrevivência à própria erosão.
★★★★★★★★★★