Romance com Julia Roberts que é uma lâmina no coração  — na Max Gaumont / Columbia Tristar Film

Romance com Julia Roberts que é uma lâmina no coração — na Max

Poucos filmes se atrevem a expor as relações humanas com a frieza de uma lâmina recém-afiada, cortando fundo sem anestesia. “Closer — Perto Demais” não apenas aceita esse desafio, como transforma a dissecação do desejo e da traição em um espetáculo cruelmente fascinante. Adaptado por Patrick Marber de sua própria peça, o roteiro conduz os personagens a um jogo impiedoso onde o amor é um artifício, e a dor, a única certeza. Mike Nichols, com sua direção magistral, desmonta qualquer ilusão de romance e nos entrega um estudo cortante sobre a vulnerabilidade e a manipulação nos relacionamentos.

Nada no filme se encaixa na previsibilidade das narrativas sentimentais convencionais. Os diálogos, afiados como punhais, não buscam reproduzir conversas do mundo real, mas revelar o que geralmente permanece submerso. O que vemos não são meros encontros e desencontros, mas uma autópsia emocional conduzida com precisão cirúrgica. Os personagens não são apenas homens e mulheres em conflito: são ideias encarnadas, arquétipos de um embate universal entre desejo e desapego, verdade e mentira, posse e renúncia.

Dan (Jude Law), escritor frustrado com aspirações literárias, encontra Alice (Natalie Portman), uma jovem americana que oscila entre fragilidade e astúcia. O vínculo entre os dois, no entanto, se desestabiliza com a chegada de Anna (Julia Roberts), uma fotógrafa marcada por contradições, que por sua vez atrai o interesse de Larry (Clive Owen), um dermatologista de olhar implacável e brutalidade latente. O enredo se desenrola como uma coreografia de enganos e confissões, onde cada gesto tem um peso maior do que parece — e cada palavra, uma consequência inescapável.

O impacto do filme se deve, em grande parte, às atuações, que carregam nas entrelinhas aquilo que os diálogos já deixam cortantemente claro. Natalie Portman constrói Alice com um misto de inocência e calculismo, desafiando constantemente as percepções do espectador. Clive Owen, dono das cenas mais memoráveis, dá a Larry uma mistura de brutalidade e inteligência que torna seu personagem ao mesmo tempo repulsivo e irresistível. Jude Law habita Dan como um homem consumido pelo desejo e pelo medo de ser insuficiente. Julia Roberts, por sua vez, surpreende ao dar a Anna uma profundidade que transcende a aparente frieza, revelando camadas de dor e indecisão.

Ao contrário das histórias que se limitam a retratar romances despedaçados,  “Closer — Perto Demais” se lança em uma investigação sobre a hipocrisia dos sentimentos e a maneira como a verdade, muitas vezes, é mais insuportável do que a mentira. Os personagens exigem confissões apenas para destruí-las; buscam a verdade, mas são incapazes de lidar com ela. Essa dialética corrosiva faz do filme um experimento cruelmente envolvente, onde o desconforto é a única emoção garantida.

A ausência de redenção no desfecho reforça sua abordagem implacável. Não há moral reconfortante, nem fechamento sentimental. O que resta são destroços emocionais e a constatação incômoda de que, no fim, todos os personagens estão aprisionados em um ciclo interminável de autossabotagem e desejo insatisfeito. Assistir a “Closer” não é apenas presenciar um drama — é encarar, sem filtros, as verdades que evitamos dizer em voz alta. Para alguns, uma experiência desconfortável. Para outros, uma epifania inescapável.

Filme: Cloreto — Perto Demais
Diretor: Mike Nichols
Ano: 2004
Gênero: Drama/Romance
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★