Desde “As Horas” (2002), a biografia de Virginia Woolf (1882-1941) assinada por Stephen Daldry, Nicole Kidman parece ter tomado um gosto especial por dar vida a mulheres desajustadas. Intérprete irregular, capaz de atuações verdadeiramente mediúnicas como quando incorporou a escritora londrina e arrebatou crítica e público, vencendo o Oscar de Melhor Atriz em 2003, o primeiro para uma australiana, e de desempenhos medíocres, feito o que se assiste em “Reencarnação” (2004), dirigido por Jonathan Glazer, ou “A Feiticeira” (2005), levado à tela por Nora Ephron (1941-2012) — certo, os filmes não ajudavam… —, Kidman deixa evidente que busca em seu trabalho um vigor que nem sempre alcança. É o que se pode dizer de “Holland”, no qual a diretora Mimi Cave disfarça os altos e baixos de sua protagonista com soluções técnico-estéticas a exemplo da fotografia de Pawel Pogorzelski e da edição de Martin Pensa, fazendo de seu longa mais um manifesto de estilo que a condução de uma narrativa.
Nancy Vandergroot, uma professora em Holland, Michigan, município de colonização holandesa no extremo norte americano, não tem muitas preocupações além de encarregar-se do desfile em homenagem aos fundadores e cultivar suas tulipas. O roteiro de Andrew Sodroski faz todas as referências que pode aos elementos mais característicos dos Países Baixos, como moinhos de vento e garotas em trajes típicos, puxando o enredo para uma exegese ambígua, que tanto pode aludir ao orgulho dos cidadãos de Holland como a uma tentativa de fuga psicológica. Nancy e Fred, seu marido optometrista interpretado por Matthew Macfadyen, são pais de Harry, que brinca com a coleção de trens que o chefe da família mantém no porão, outra menção à pátria dos ancestrais e seus 6.830 quilômetros de trilhos — e também, claro, à dificuldade daquela gente quanto a encontrar uma alma para chamar de sua. Nancy catalisa essa sensação de busca constante, quiçá frenética, por lugar no mundo, agravada depois de um episódio suspeito.
“Holland” começa mesmo no momento em que Nancy dá pela falta de um brinco e pensa que Candy, a babá de Harry, pode ser a ladra. Coincidência ou não, Fred viaja para mais um compromisso profissional e, pouco depois, Nancy encontra no lixo uma passagem amassada para Madison, no Wisconsin, quando ele disse que iria para uma outra cidade de Michigan. Cave estica a corda do “mistério” acrescentando à cena a figura de Dave Delgado, um ex-colega de escola da personagem de Kidman, aparentemente o único capaz de prestar-lhe algum socorro e, surpresa!, emerge uma paixão. Gael García Bernal não consegue lustrar a performance de Kidman, sem achar também o tom de Dave, um sujeito igualmente atormentado por escolhas equivocadas. Ao cabo de 108 minutos, Macfadyen tem um pouco mais de sorte ao explorar os meandros mais secretos de Fred; todavia, este é um filme ligeiro sobre pessoas imperscrutáveis, uma contradição que nem belas imagens redimem.
★★★★★★★★★★