Thriller de Spike Lee com Denzel Washington na Netflix — vale repetir a sessão dez vezes Divulgação / Universal Pictures

Thriller de Spike Lee com Denzel Washington na Netflix — vale repetir a sessão dez vezes

Spike Lee conduz “O Plano Perfeito” com uma abordagem que desafia as convenções do thriller de assalto. Longe de se contentar com reviravoltas previsíveis ou um desfecho pirotécnico, o diretor constrói uma narrativa que se desdobra com precisão cirúrgica, confiando na inteligência do espectador para decifrar suas pistas. A tensão não decorre apenas da ação direta, mas de um embate estratégico onde cada detalhe importa. Esse refinamento narrativo, aliado a um elenco primoroso e a um domínio técnico irretocável, eleva o filme a um patamar de referência dentro do gênero.

Denzel Washington, no papel do detetive Keith Frazier, entrega uma performance que equilibra astúcia e ironia, destacando-se na dinâmica de inteligência que mantém com Dalton Russell, o arquiteto do assalto, interpretado com precisão calculada por Clive Owen. Mesmo com o rosto oculto por boa parte da projeção, Owen sustenta uma presença magnética, demonstrando que a força do personagem reside não na intimidação física, mas na superioridade estratégica. A interação entre os dois conduz a trama com solidez, sustentada por diálogos afiados que evitam os clichês típicos de policiais obstinados e criminosos megalomaníacos.

O elenco de apoio reforça a complexidade do enredo. Christopher Plummer imprime gravidade a um empresário cujo passado nebuloso se torna peça-chave da narrativa. Willem Dafoe e Chiwetel Ejiofor, embora secundários, enriquecem a trama com atuações seguras. Já Jodie Foster assume um papel ambíguo como uma influente negociadora, cuja presença insinua mais do que revela. Se há um ponto a ser questionado, é a maneira como sua personagem poderia ter sido explorada com maior profundidade, dado seu potencial de articular forças nos bastidores do conflito.

A estrutura narrativa do filme se destaca por uma montagem que intercala flash-forwards estratégicos, adiantando fragmentos do desfecho sem comprometer o suspense. Esse recurso adiciona camadas à experiência do espectador, que se vê instigado a reconstruir mentalmente a cronologia dos eventos. Além disso, Lee dosa habilmente momentos de alívio cômico sem diluir a tensão, mantendo a trama envolvente sem apelar para distrações artificiais. A direção de fotografia, com enquadramentos calculados e um uso expressivo da iluminação, reforça a atmosfera de incerteza e antecipação.

Diferente dos thrillers convencionais, que frequentemente apostam na ação frenética e em confrontos físicos para manter o interesse, “O Plano Perfeito” é como um jogo de xadrez psicológico, onde cada peça tem sua função específica e cada movimento repercute na engrenagem narrativa. A tensão não se limita ao assalto em si, mas se estende às motivações ocultas de seus participantes e ao subtexto social que permeia a trama. O filme sugere, sem didatismo, questões sobre poder, corrupção e moralidade, expandindo sua relevância para além do mero entretenimento.

Embora não alcance a contundência política de “Faça a Coisa Certa” ou a carga emocional de “A Última Noite”, “O Plano Perfeito” reafirma a versatilidade de Spike Lee, que se apropria do gênero sem abrir mão de sua assinatura estilística. O resultado é um thriller inteligente e envolvente, que desafia o espectador a acompanhar suas sutilezas e a refletir sobre o que permanece nas entrelinhas. A sensação não é de simples satisfação, mas de uma inquietação bem-vinda, como se a história pudesse continuar se desenrolando fora da tela, na mente do público.

Filme: O Plano Perfeito
Diretor: Spike Lee
Ano: 2006
Gênero: Crime/Drama/Mistério/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★