Independentemente do que possamos querer, o tempo, senhor da razão e tudo quanto há de inexplicável no mundo, avança implacável, jamais espera, não para nunca, não admite ser desapontado e, caprichoso, tem suas próprias vontades e seus planos nada moderados para o homem. O progresso é o que fazemos dele, e esse é um tópico que suscita outros debates, como os que “Mãe x Androides” analisa do jeito conveniente a um filme assim. Mattson Tomlin tenta dar uma solução judiciosa a um problema fundamental da humanidade, sobretudo nessas primeiras quadras deste insano século 21, e levanta questionamentos acerca das possíveis recompensas de se admitir as próprias obrigações e ser dono de sua sorte, o que vem a significar também não terceirizá-lo a dispositivos cujos propósitos ainda não conhecemos. O diretor-roteirista bate nessa tecla, como já havia feito no texto de Power (2020), de Ariel Schulman e Henry Joost, e arrisca-se a dizer que pode não sobrar nada, nem ninguém. Apenas um mundo frio como o metal que pisará nossas caveiras.
Na imagens de promoção de “Mãe x Androides” uma mulher aparece como um vulto, talvez um quebra-cabeça, no qual falta uma peça. Georgia, a protagonista vivida por Chloe Grace Moretz, é uma universitária de dezenove anos que fica sabendo que está grávida na mesma noite em que uma horda de robôs se conflagra e dá início a um motim. Incumbidos dos trabalhos mecânicos de que o homem foi capaz de livrar-se depois de séculos de evolução, os autômatos absorveram o espírito de corpo de que o gênero humano às vezes se reveste e não querem mais fazer essas tarefas, deixando-o claro da pior maneira: matando seus patrões de carne e osso e obrigando quem consegue sobreviver a fugir para o deserto. Georgia mantém com o namorado, Sam, de Algee Smith, um relacionamento fugaz em que o amor importa pouco e está ainda mais estremecido por causa do bebê que não tarda, mas agora esses dois inconsequentes terão de se suportar se quiserem continuar vivos, enquanto a futura mãe pensa em como será ter um filho nas circunstâncias em que se encontram.
Tomlin compõe um thriller de ficção científica pós-apocalíptico cheio de altos e baixos, mas que jamais pode ser acusado de sensacionalista, uma vez que a inteligência artificial já é um dado da realidade e uma ameaça. A fotografia de Pat Scola, toda em tons lúgubres, e uma grande colaboradora do desempenho de Moretz, pequeno respiro de inovação em meio às produções que miraram o assunto de maneira mais ou menos assertiva e acertada — malgrado “Ex_Machina: Instinto Artificial” (2014), de Alex Garland, seja o filme definitivo sobre o tema até agora. Talvez o mérito de “Mãe x Androides”, aquele que se destaca sobre quaisquer outros, seja a despretensão: todos somos capazes de prever o que há de passar de uma cena para a seguinte, e permanecemos sintonizados. Eis um dos mistérios do cinema.
★★★★★★★★★★