Ao lado de Friedrich Nietzsche (1844-1900) e Martin Heidegger (1889-1976), Arthur Schopenhauer (1723-1790) compõe a trindade nada santa da filosofia contemporânea. A obra de Schopenhauer talvez seja o ponto de interseção entre o pensamento nietzschiano e o de Heidegger. Ainda que grande parte de sua produção se comunique diretamente com a de Nietzsche e Heidegger, Schopenhauer tem uma maneira absolutamente original de ver a vida e o homem, sem todo o niilismo de Nietzsche — e alguém teria? — e tampouco a visão o seu tanto poética do colega de Messkirch. Os três tiveram trajetórias parecidas: Schopenhauer nasceu em um país com tradição em estimular e fomentar a educação formal, como é o caso da Alemanha dos outros dois; era igualmente um obcecado com o trabalho, primeiro como homem de negócios, carreira da qual acabou por abdicar, graças a uma herança paterna, e depois assumindo sua vocação acadêmica. Os irmãos Ethan e Joel Coen parecem seguidores cada vez mais convictos de Schopenhauer, e “Fargo — Uma Comédia de Erros”, sua “A Quadrúplice Raiz do Princípio de Razão”.
O homem não sabe querer, pois ao querer já espalha destruição por todo lado, e, portanto, há que se negar toda vontade, mesmo (ou em especial) as que, aparentemente, possam induzir a supostas boas intenções. Com Arthur Schopenhauer como mentor, elaboramos uma listinha daquelas, com seis filmes que tomam o conjunto de ensinamentos do mestre por guia. Homem nenhum nasceu para viver sozinho. Será mesmo? Baseado em uma história real acontecida em Minnesota em 1987, “Fargo”, despretensiosamente, também discorre sobre os quatro componentes do que há de menos parcial no homem, o princípio da identidade; o da não contradição; o do terceiro excluído; e o da casualidade.
Os diretores-roteiristas situam seu filme num cenário de profunda desolação, cercado por neve, onde Jerry Lundegaard, o vendedor de carros interpretado por William H. Macy, comparece a uma reunião com dois criminosos num diner meio sombrio. Jerry, cujo sogro, Wade Gustafson, é o dono da concessionária onde ele trabalha, conduz o esquema, sem saber que seu plano mais ousado vai soçobrar miseravelmente não muito tempo depois e, pior, que já está na mira de Marge Gunderson, uma policial famosa nas redondezas por ser durona, já está no seu encalço. Frances McDormand faz por merecer o primeiro dos três Oscars de Melhor Atriz por sua interpretação de Gunderson e os irmãos Coen levaram para casa a estatueta de Melhor Roteiro Original. Enquanto o público quebrava a cabeça tentando prever como essa joia do cinema recente — sobre a qual é tão difícil falar sem que se estrague a surpresa — chegaria ao fim.
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