Com mais de 13 milhões de exemplares vendidos, um dos romances mais amados da década virou filme — e acaba de estrear no Prime Video Divulgação / Hallmark Channel

Com mais de 13 milhões de exemplares vendidos, um dos romances mais amados da década virou filme — e acaba de estrear no Prime Video

A certeza de que a vida tem começo e fim não impede o ser humano de tropeçar na ilusão de que alguma resposta definitiva repousa logo adiante, bastando caminhar o bastante para alcançá-la. O que se acumula, no entanto, são hipóteses frágeis e enganos tranquilizadores. Ainda assim, seguimos — não por sabedoria, mas por necessidade. Cruzamos desertos emocionais e reencontramos rostos esquecidos com a fé de que, talvez, ali exista um alívio. Em certos momentos, a esperança e o medo se confundem a ponto de se tornarem a mesma substância, feita de desejo e desamparo.

Não há pressa nas jornadas que realmente importam. O ciclo de uma tartaruga marinha, por exemplo, atravessa eras com a paciência dos que sabem que tudo retorna ao ponto de partida. A metáfora, longe de gratuita, embala o enredo silencioso de uma mulher que, empurrada por demissões e mágoas adormecidas, reencontra o mar da sua infância — e com ele, a mãe que a feriu, o ex-namorado que jamais se foi por completo e a vulnerabilidade que a maturidade não conseguiu apagar. O reencontro com o passado não a convida à nostalgia, mas à reavaliação do que vale guardar e do que já perdeu o prazo de validade emocional.

O gesto de voltar à cidade natal carrega menos heroísmo do que se costuma supor. Charleston surge não como lar, mas como espelho: um espaço onde velhas promessas não cumpridas se materializam em olhares e silêncios. O roteiro de Maria Nation, ao adaptar a trama de Mary Alice Monroe, opera com um senso agudo de ironia existencial: Caretta não erra por ingenuidade, mas por insistir na crença de que pode controlar os desvios do destino. A fragilidade da personagem repousa na sua obstinação em se manter firme, mesmo quando tudo ao redor grita por rendição.

As marés emocionais do filme não seguem a lógica dos grandes dramas: elas vêm de mansinho, como a areia que se acumula aos poucos nas pegadas antigas. Spottiswoode não tenta elevar o tom — prefere sugerir, construir aos poucos uma rede de tensões que explodem apenas na hora certa. A força do enredo está justamente na contenção. Minka Kelly capta com delicadeza as contradições de uma mulher que precisa aprender a pedir desculpas, não apenas perdoar. Já Andie MacDowell dá à matriarca doente a gravidade que certos laços familiares exigem: há doçura, mas há também culpa, distância e medo de não dar tempo.

O mar, aqui, funciona como território de renascimento e sentença final. Cada ovo de tartaruga enterrado na areia carrega o peso simbólico do que é preciso proteger — e deixar partir. A tempestade que assola a região, longe de servir apenas como clímax visual, atua como catalisadora emocional: é no olho do furacão que as personagens decidem abandonar seus escudos. Não há como sair ileso da colisão entre passado e presente, tampouco há garantias de que os dias seguintes serão mais leves. Mas talvez essa seja a única forma honesta de seguir: aceitando que há beleza em não saber para onde se vai.

Chad Michael Murray, com sua presença econômica, não rivaliza com as mulheres da trama — ele se encaixa. Como quem entende que às vezes o papel do outro é apenas permanecer. Essa percepção, rara em narrativas mais convencionais, reforça a vocação do filme para lidar com nuances que passam despercebidas em análises apressadas. Não se trata de romantizar reconciliações ou emendar finais felizes a todo custo. Trata-se de perceber que há uma ternura possível mesmo nos vínculos partidos — e que, por mais frágil que pareça, essa ternura já é, por si só, um gesto de resistência.

No fundo, o que se articula é menos uma história de superação do que um ensaio sobre os limites do que podemos consertar. E é essa honestidade bruta que sustenta a experiência: não há grandes revelações, apenas pequenas epifanias entre uma brisa e outra. Como acontece com as tartarugas que voltam sempre ao mesmo ponto da costa para pôr seus ovos, certos caminhos são percorridos não por escolha, mas por um tipo de memória que o corpo guarda, mesmo quando a consciência tenta esquecer. Nesse sentido, viver é também retornar — não para reviver, mas para redimensionar o que sobrou.

Filme: A Casa na Praia
Diretor: Roger Spottiswoode
Ano: 2018
Gênero: Drama/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★