A série que vai te fazer mandar ASSISTE ISSO AGORA no grupo do WhatsApp. Chegou na Netflix Erin Simkin / Netflix

A série que vai te fazer mandar ASSISTE ISSO AGORA no grupo do WhatsApp. Chegou na Netflix

A morte não extingue o ridículo — apenas o desloca. Quando falha em conduzir seus escolhidos ao destino final, resta aos que ficam suspensos entre dois mundos procurar refúgio em lugares onde o tempo parece também ter desistido de passar: uma torre esquecida, um litoral vazio, um casarão mofado. Essas almas errantes carregam um sofrimento difícil de traduzir, mas comum a todos nós. A dor que sentimos é sempre uma linguagem privada, e por mais que nos alinhemos no coro universal do sofrimento humano, o desalento de cada um é uma ilha cercada por um mar de mal-entendidos. Ainda assim, há um tipo de agonia tão absurda que roça o patético, e ao fazê-lo, provoca tanto o riso quanto a compaixão.

É nesse terreno ambíguo que se move A. B. Wynter, mordomo-chefe da residência oficial do presidente dos Estados Unidos, cuja súbita morte funciona como o gatilho narrativo de “Assassinato na Casa Branca”. A série, roteirizada pelo advogado Paul William Davies e produzida pelo império televisivo de Shonda Rhimes, recicla com ironia fórmulas gastas do whodunit e injeta nelas um humor voluntariamente deslocado. Inspirado no livro de não ficção de Kate Andersen Brower, o enredo abandona o ponto de vista de Wynter quase de imediato, concentrando-se na excêntrica investigadora Cordelia Cupp — uma policial desastrada com alma de ornitóloga, espécie rara de detetive que enxerga mistérios com a mesma minúcia com que estuda corujas e mariquitas ao telescópio.

É durante um show de Kylie Minogue na Ala Oeste — parte de uma tentativa diplomática de estreitar laços com a Austrália — que o cadáver de Wynter é descoberto, rompendo a pompa presidencial com a crueza do absurdo. Enquanto se cochicha que Hugh Jackman está na plateia, lá em cima o corpo repousa em silêncio. Jane Curtin, no papel da sogra do presidente, dá o alarme com gritos histéricos, inaugurando a coleção de personagens cínicos, caricatos ou apenas profundamente infelizes que Cupp terá de interrogar ao longo dos 132 quartos e seus 157 possíveis culpados — nenhum disposto a ajudar, todos guardando segredos que beiram o delírio.

Mais uma produção da prolífica Shondaland, a série não disfarça o desejo de parodiar as próprias convenções do gênero, mas flutua entre momentos de engenhosidade e uma certa resistência em assumir sua própria desordem. Cordelia é interpretada com brilho por Uzo Aduba, que confere uma densidade inesperada a uma personagem construída para o excesso. Ainda assim, por mais que sua atuação fascine, a estrutura da série hesita entre o grotesco e o procedural, sem escolher com clareza onde quer fincar os pés.

Embora conte com episódios visualmente bem resolvidos e diálogos que por vezes resvalam no nonsense engenhoso, a produção não alcança a contundência de “Inventando Anna” ou o apelo irresistível de “Bridgerton”. Em vez disso, parece querer transformar o absurdo em método, sem compreender que o caos só funciona quando é coreografado com precisão. “Assassinato na Casa Branca” tem lampejos de originalidade, mas sua ironia nem sempre acerta o alvo. Talvez seja essa, afinal, sua assinatura involuntária: um mistério cômico que não sabe se prefere rir de si mesmo ou apenas confundir quem o assiste.

No fim, o cadáver menos incômodo talvez seja o da lógica. E esse, como tantos outros, ninguém parece disposto a enterrar.


Série: Assassinato na Casa Branca
Criação: Paul William Davies
Ano: 2025
Gêneros: Mistério/Comédia 
Nota: 7/10