Desde os primórdios da exploração espacial, o homem tem projetado no cosmos seus anseios mais profundos: a busca por respostas, o desejo de transcendência, a necessidade de compreender seu lugar no universo. “Ad Astra” não apenas dialoga com esse imaginário, mas o ressignifica ao construir uma jornada que extrapola a vastidão do espaço e se aprofunda nos labirintos da psique humana. James Gray abandona a grandiosidade convencional das epopeias intergaláticas para esculpir uma narrativa introspectiva, ancorada na fragilidade emocional de um protagonista em rota de colisão com suas próprias verdades.
A primeira cena, um prodígio técnico que se estende por minutos sem pressa, estabelece de imediato o tom da experiência: um espetáculo visual de imersão absoluta. Nada é gratuito; cada enquadramento e escolha estética comunica a solidão esmagadora do espaço e, por extensão, do protagonista. Brad Pitt encarna um astronauta que carrega no olhar a tensão contida de alguém que reprime mais do que expressa, compondo uma atuação em que os silências dizem tanto quanto as palavras. Não se trata apenas de uma missão interestelar; é uma expedição ao centro de uma dor latente, um acerto de contas com as sombras que acompanham o personagem muito além das fronteiras da Terra.
Ao invés de recorrer a longos diálogos explicativos, o filme opta por narrações em off que, longe de didáticas, aprofundam a dimensão psicológica do protagonista. Esse recurso não apenas reforça o senso de isolamento, mas também transforma a jornada externa em um reflexo direto da turbulência interna que o move. O espaço, nesse contexto, é menos um horizonte de conquista e mais um vácuo que amplifica os ecos de uma existência fragmentada.
Gray conduz sua narrativa sem pressa, construindo uma atmosfera hipnótica que pode dividir o público. Para aqueles acostumados a um ritmo mais acelerado, a cadência contemplativa pode soar como ausência de dinamismo. No entanto, essa escolha se justifica plenamente, pois cada pausa, cada silêncio, cada plano meticulosamente composto serve para edificar a carga emocional que culmina em um desfecho de impacto singular. A fotografia de Hoyte Van Hoytema traduz essa abordagem com uma paleta de cores e enquadramentos que evocam tanto a imensidão desoladora do espaço quanto sua beleza etérea, criando imagens que permanecem na memória muito depois dos créditos finais.
A trilha sonora atua como um elemento narrativo por si só, pontuando momentos de tensão e introspecção com precisão cirúrgica. E, embora o filme flerte com conceitos científicos, sua prioridade não está na acurácia técnica, mas sim na autenticidade emocional. Esse não é um ensaio sobre os limites do conhecimento humano, mas sim sobre os limites da própria existência, sobre o peso das ausências e a interminável busca por conexão.
“Ad Astra” ultrapassa a ficção científica ao se tornar um estudo de personagem de rara intensidade. Para quem se permite embarcar em sua jornada meditativa, a experiência se revela menos um filme e mais uma incursão ao abismo das emoções humanas. Se o espaço exterior parece infinito, o que se esconde dentro de nós é ainda mais insondável.
★★★★★★★★★★