A história de coragem e resiliência de Segunda Guerra, que poucos conhecem, na Netflix Divulgação / Pantaleon Films

A história de coragem e resiliência de Segunda Guerra, que poucos conhecem, na Netflix

Em meio ao vasto repertório de narrativas sobre a Segunda Guerra Mundial, algumas histórias desafiam o esquecimento e se impõem pela força de seu impacto humano. “Resistência” reconstrói um desses relatos ao se debruçar sobre Marcel Marceau, um artista que, antes de se tornar um ícone da mímica, desempenhou um papel crucial no salvamento de crianças judias. O diretor Jonathan Jakubowicz evita a armadilha do sentimentalismo excessivo e opta por um registro que equilibra heroísmo e tragédia, garantindo que a história se sustente por sua própria força dramática, sem apelos fáceis à emoção.

Jesse Eisenberg, encarregado de dar vida a Marcel, assume um desafio notável ao transitar de sua persona habitual para um protagonista inicialmente alheio ao horror da guerra, mas que gradativamente se vê arrastado para o epicentro do conflito. A evolução do personagem é conduzida com sutileza, evitando transformações abruptas ou artificialmente engrandecidas. Embora o sotaque francês do ator possa soar forçado em alguns momentos, seu desempenho consegue capturar a essência de um homem que aprende, a contragosto, a carregar o peso da responsabilidade moral.

A construção narrativa do filme é engenhosa. O ponto de partida é uma cena devastadora: a jovem Elsbeth testemunha o assassinato brutal de seus pais pelas mãos nazistas. Esse momento inicial estabelece o tom e imprime uma urgência visceral às decisões subsequentes. A partir dessa premissa, a história é enquadrada por um discurso do General George S. Patton em 1945, contextualizando a jornada de Marcel dentro de um arco que reforça a relevância histórica de suas ações.

O cerne da narrativa reside nas interações humanas que constroem a resistência silenciosa contra o terror. A relação de Marcel com as crianças resgatadas não é tratada de forma simplista, evitando idealizações. Em paralelo, a dinâmica entre Marcel e Emma (Clémence Poésy) transcende o romance convencional, funcionando como um reflexo da pressão psicológica e dos dilemas impostos pela guerra. A narrativa não se contenta em apenas ilustrar a bravura dos personagens, mas explora as consequências emocionais de suas escolhas.

No aspecto visual, o filme utiliza a ambientação para ampliar a dicotomia entre o horror e a esperança. A hostilidade das paisagens ocupadas pela Gestapo contrasta com momentos de alívio, nos quais a arte de Marcel se torna um refúgio momentâneo. A tensão é elevada com a presença de Klaus Barbie, interpretado por Matthias Schweighöfer, cuja frieza calculista confere ao antagonista uma presença ameaçadora sem precisar recorrer a exageros. Os confrontos entre Barbie e Marcel figuram entre os momentos mais intensos da trama, destacando o antagonismo entre a crueldade despótica e a resiliência silenciosa.

A trilha sonora desempenha um papel determinante na imersão do espectador, pontuando com precisão os momentos de tensão e alívio. Sequências como a fuga através da floresta e a travessia dos Alpes reforçam o senso de perigo iminente, mantendo a narrativa em constante movimento. O desfecho do filme, ao trazer Marcel Marceau em sua plenitude artística, oferece um fechamento que transcende a história pessoal e resgata a dimensão simbólica de sua jornada.

“Resistência”, apesar de algumas limitações, comove maneira como transforma um capítulo pouco explorado da história em um relato de impacto genuíno. O filme não apenas relembra um legado de coragem, mas questiona a natureza da resistência em tempos de barbárie. Ao evitar maniqueísmos e clichês fáceis, ele convida o espectador a refletir sobre o papel da arte não apenas como expressão, mas como um ato de desafio diante do inominável.

Filme: Resistência
Diretor: Jonathan Jakubowicz
Ano: 2020
Gênero: Biografia/Drama/Épico
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★