Sucesso nas livrarias, fenômeno nas telas: o romance visto por 70 milhões de pessoas no mundo todo, na Netflix Loris T. Zambelli / Netflix

Sucesso nas livrarias, fenômeno nas telas: o romance visto por 70 milhões de pessoas no mundo todo, na Netflix

Adaptar um romance extenso e repleto de nuances para um longa-metragem exige um equilíbrio delicado entre fidelidade ao material original e fluidez narrativa. No caso de “O Fabricante de Lágrimas”, essa transição acabou se tornando um obstáculo incontornável. O que poderia ter sido um drama envolvente, sustentado por camadas psicológicas e relações meticulosamente construídas, reduziu-se a uma história apressada e superficial, que apenas arranha a superfície de temas potencialmente impactantes.

O mérito do filme está química entre os protagonistas, cuja interação transmite desejo e anseio. Rigel (Simone Baldasseroni) e Nica (Caterina Ferioli) cresceram no mesmo orfanato e acabaram sendo adotados pela mesma família. Ambos tiveram infâncias traumáticas e experiências dolorosas. Contudo, essa intensidade é prejudicada pelo desenvolvimento narrativo inconsistente. A trajetória dos personagens é esboçada de forma acelerada, como se cada evento de seu passado fosse um item em uma lista a ser verificado, sem tempo para que suas implicações emocionais se consolidem. Questões como traumas, abusos e transtornos psicológicos, que poderiam conferir profundidade à trama, são apenas sugeridas, deixando o público sem uma compreensão real das dores e motivações dos personagens.

Essa pressa também compromete a construção do romance central. A relação entre os protagonistas carece de um desenvolvimento orgânico, parecendo surgir de um roteiro que pressupõe conexão emocional sem estabelecê-la de fato. A ausência de uma base narrativa sólida enfraquece o impacto dramático das reviravoltas românticas e impede que o espectador se envolva genuinamente com o relacionamento.

O ritmo fragmentado do filme agrava esses problemas. Cortes abruptos e lacunas temporais notáveis quebram a continuidade da história, exigindo que o público preencha espaços com suposições. A sensação constante é de que se está assistindo a uma versão condensada de uma narrativa mais extensa, na qual elementos essenciais foram suprimidos. Para uma adaptação que exige a retenção da complexidade emocional do material de origem, essa abordagem se revela um detrimento significativo.

O texto do roteiro reforça essa superficialidade. Os diálogos, muitas vezes excessivamente melodramáticos, funcionariam melhor na literatura, onde a subjetividade das palavras pode ser modulada pela imaginação do leitor. Na tela, essas falas soam artificiais e forçadas, gerando momentos involuntariamente constrangedores. O impacto emocional esperado se dilui na falta de naturalidade e na dificuldade dos atores em imprimir verdade a linhas que parecem pertencer a um romance juvenil estereotipado.

A fotografia é elegante e bem composta, utilizando uma paleta de cores cuidadosamente escolhida para refletir a atmosfera sombria e melancólica da narrativa. Os enquadramentos são meticulosamente planejados, criando uma ambientação imersiva que, paradoxalmente, não encontra correspondência na profundidade emocional da história. A trilha sonora, embora em alguns momentos bem utilizada, inclui músicas pop deslocadas que, ao invés de reforçar a experiência, quebram a imersão.

Quanto ao elenco, os atores fazem o que está ao seu alcance dentro das limitações impostas pelo roteiro. Baldasseroni exibe carisma, mas não recebe material suficiente para desenvolver seu personagem de maneira tridimensional. Ferioli tem uma atuação correta, mas sem grande expressividade. A interação entre ambos é esteticamente agradável, mas carece do peso dramático necessário para conquistar o público.

“O Fabricante de Lágrimas” encontra seu público entre aqueles que buscam uma história romântica visualmente atraente, sem a exigência de profundidade narrativa. Para espectadores que valorizam complexidade emocional e desenvolvimento minucioso de personagens, a experiência pode se revelar frustrante. Uma adaptação no formato de série limitada poderia ter permitido uma exploração mais cuidadosa dos conflitos e relações, oferecendo um desdobramento narrativo mais fiel ao potencial do material original. Como filme, acaba se tornando uma produção visualmente bonita, mas vazia de impacto e da densidade que a história prometia.

Filme: O Fabricante de Lágrimas
Diretor: Alessandro Genovesi
Ano: 2024
Gênero: Drama/Fantasia/Romance
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★