Baseado em um livro que vendeu 5 milhões de exemplares, o filme que rendeu a Kate Winslet sua 15ª indicação ao Globo de Ouro — agora no Prime Video Divulgação / Sky

Baseado em um livro que vendeu 5 milhões de exemplares, o filme que rendeu a Kate Winslet sua 15ª indicação ao Globo de Ouro — agora no Prime Video

Desde seu surgimento, no século 6 a.C., a filosofia tenta dar ao homem alguma explicação para as muitas inquietações da alma humana. Ao tentar compreender o que se passa no espírito de cada indivíduo, valorizando justamente o caráter de especificidade, em que cada um é responsável por suas próprias escolhas, pelo caminho que decide trilhar — que por tortuoso que seja, pode conduzir a algum lugar de proveito —, por seus tropeços e suas glórias, o pensamento filosófico se organiza a fim de dar à vida uma ideia de que tudo converge para um mesmo fim, qual seja, extrai do mundo, da interação com os outros e, por óbvio, de como processamos essas informações à luz da nossa própria visão acerca da existência. Uma ideia muito particular de filosofia foi a companheira de Lee Miller (1907-1977), uma mulher que viu a História fazendo-se diante de seus olhos atentos. Miller, uma das primeiras jornalistas a saber que a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) havia acabado e que Adolf Hitler (1889-1945) estava morto, lançou-se a uma jornada homérica rumo ao que julgava ser sua vocação, retratar os últimos movimentos do nazismo e de seu líder endiabrado, o núcleo de “Lee”, um recorte da vida da ex-modelo que tornou-se uma das mais célebres fotógrafas do século 20.

Seja pela amplitude do tema, seja pelo alcance mercadológico, os filmes de guerra têm lugar garantido no cinema, por preservarem o caráter belicoso dessas narrativas enquanto diretores esmeram-se por contextualizar os eventos apresentados, quase sempre espinhosos, intrincados, que dependem da justa construção dramática para que façam sentido e, por óbvio, o espectador os absorva. Diferentes visões de um fato histórico, expostas e mesmo defendidas por diretores que convivem naquele universo por meses a fio, vêm à tona em produções muito bem-cuidadas, que põem por terra verdades monolíticas sobre dado assunto.

A diretora estreante Ellen Kuras mergulha de cabeça no caudaloso roteiro de John Collee, Liz Hannah e Marion Hume, uma adaptação fidedigna de “The Lives of Lee Miller” (“as vidas de Lee Miller”, em tradução literal; 1985), livro do fotógrafo britânico Antony Penrose, a fim de tirar dele passagens de fato extraordinárias da trajetória da protagonista, alguém que parecia disposta a pagar com a própria vida o privilégio de estar no lugar certo, na hora certa. Filho de Miller, Penrose surge em momentos espaçados do longa numa pungente e derradeira conversa com a mãe, o que só fica óbvio na iminência do desfecho. Entre outros assuntos, os dois falam sobre o famoso registro de Miller na banheira do Führer, e Kate Winslet e Josh O’Connor encerram os 117 minutos batendo na tecla da emoção, o maior atributo profissional de Lee Miller, que jamais pensou em deixar de lado. A humanidade agradece.

Filme: Lee
Diretor: Ellen Kuras
Ano: 2023
Gênero: Biografia/Drama/Guerra
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.