A comédia romântica da Netflix que prova que rir e se apaixonar ao mesmo tempo não só é possível, como inevitável Divulgação / GEM Entertainment

A comédia romântica da Netflix que prova que rir e se apaixonar ao mesmo tempo não só é possível, como inevitável

A paixão, essa força desordenada, desnivela os mais racionais e rebaixa a lógica a um plano secundário. De modo inusitado, torna todos vulneráveis, inclinados a reações absurdas e, por vezes, patéticas. O fenômeno não precisa sequer envolver diretamente quem o observa: basta o vislumbre de alguém em estado de encantamento para que a atmosfera ao redor se contamine. Os que já estão mergulhados na experiência amorosa sentem seu fervor renovar-se; os que ainda a procuram oscilam entre esperança e um toque de inveja.

Essa ambivalência emocional ressoa em “Amor em Little Italy”, uma comédia romântica que, sem pudor, ridiculariza os excessos do sentimento e suas inevitáveis turbulências. Donald Petrie, veterano na arte de dissecar relações, conduz uma trama que não se limita a um único romance, mas percorre diferentes gerações presas a um desentendimento que insiste em atravessar décadas. O roteiro, assinado por Brent Cote, Steve Galluccio e Vinay Virmani, amplia esse caos sentimental, transformando-o em um jogo de provocações e desencontros que, na realidade, dificilmente teria um desfecho harmonioso. E ainda assim, na ficção, tudo se acomoda sob o tempero certo.

O amor, afinal, é um paradoxo: ao mesmo tempo que exige entrega, carrega consigo uma dose de irracionalidade que desafia qualquer lógica cartesiana. Não à toa, pensadores e artistas dedicaram séculos a decifrar sua essência, ora exaltando-o como necessidade vital, ora denunciando-o como ilusão perigosa. O Romantismo, com sua idealização da paixão e exaltação dos impulsos, surgiu como uma resposta ao pragmatismo emergente no século XVIII. Entre paisagens bucólicas e conflitos internos, essa corrente não se restringiu às artes, mas se entranhou na própria percepção coletiva do que significa amar. Mesmo diante da modernidade acelerada, sua influência persiste, atravessando os séculos e encontrando eco no imaginário contemporâneo, onde o amor segue sendo simultaneamente um refúgio e um desafio.

Petrie, ciente de que o cenário molda a narrativa tanto quanto os personagens, escolhe um ambiente distante do brilho sofisticado de Manhattan, apostando na Little Italy de Toronto, uma comunidade marcada por tradição e rivalidade. No coração desse pequeno enclave italiano, duas famílias competem ferozmente pelo domínio das melhores pizzas da região, transformando suas cozinhas em verdadeiros campos de batalha. O diretor explora essa dinâmica de maneira astuta, construindo momentos de tensão cômica nas interações entre os Campo e os Angioli. A convivência forçada ressalta o absurdo da disputa, especialmente quando um ingrediente secreto transforma um jantar comum em uma experiência coletiva de euforia desmedida.

O retorno de Nicoletta Angioli, a Nikki, ao lar, após um período em Londres, desencadeia uma nova fase desse embate familiar. Enquanto sua presença reaviva antigas hostilidades, sua proximidade com Leo Campo, herdeiro do restaurante rival, adiciona outra camada ao conflito. A química entre Emma Roberts, que aqui se mostra mais confortável e envolvente do que em “Amor com Data Marcada” (2020), e Hayden Christensen sustenta essa versão bem-humorada de um romance impossível. Afinal, amor e gastronomia compartilham mais do que o imaginado: ambos dependem do equilíbrio entre os ingredientes certos, do tempo exato de maturação e, sobretudo, da capacidade de apreciar o momento sem receio das inevitáveis labaredas que podem surgir no processo.

Filme: Amor em Little Italy
Diretor: Donald Petrie
Ano: 2018
Gênero: Comédia/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★