A relação entre a efemeridade da vida e a inevitabilidade da morte é um dos temas mais explorados pela ficção, mas poucos filmes abraçam essa reflexão com a ambição estética e narrativa de “Encontro Marcado”. Mais do que uma simples releitura de “A Morte Faz Um Longo Tour”, este longa de Martin Brest reconstrói a fábula clássica, deslocando-a do contexto europeu da Primeira Guerra para os bastidores da América corporativa contemporânea. A premissa, contudo, mantém-se intacta: a Morte, agora incorporada pelo jovem e enigmático personagem vivido por Brad Pitt, decide experimentar a existência humana antes de cumprir sua derradeira missão.
O coração da narrativa pulsa ao redor de William Parrish (Anthony Hopkins), um magnata da comunicação prestes a completar 65 anos, cuja vida de êxitos profissionais e familiares começa a ser ameaçada por pressões externas e pelo inexorável chamado do destino. Sua trajetória, construída sobre o controle e a previsibilidade, é abalada quando a própria Morte assume uma forma tangível e se infiltra em sua rotina. Como se não bastasse o dilema de hospedar a entidade que selará seu destino, Parrish vê sua filha Susan (Claire Forlani) desenvolver um afeto crescente pelo visitante incomum, sem suspeitar de sua verdadeira identidade.
Ao contrário do que o título nacional pode sugerir, “Encontro Marcado” passa longe do escapismo romântico ou do sentimentalismo gratuito. O filme se estrutura como uma contemplação sobre a finitude, conduzindo o espectador por um ritmo cadenciado, onde os silêncios dizem tanto quanto os diálogos. A direção de Brest aposta na composição visual como um meio de intensificar a carga emocional das cenas, utilizando a iluminação e a mise-en-scène para sublinhar a delicadeza e a gravidade dos momentos cruciais. A aposta em uma narrativa pausada não é um mero artifício estilístico, mas um reflexo da temática central: a inevitabilidade da morte e sua presença constante, mesmo quando não nos damos conta.
O eixo filosófico do filme está na possibilidade de a própria Morte desenvolver emoções humanas e, ao fazê-lo, tornar-se vulnerável às mesmas paixões e dilemas que governam aqueles que ceifa. Essa abordagem confere ao personagem de Brad Pitt um magnetismo singular, oscilando entre a ingenuidade de alguém que descobre o prazer do existir e a frieza implacável de sua verdadeira natureza. Anthony Hopkins, por sua vez, constrói um protagonista que transita entre a altivez de um magnata acostumado ao controle e a fragilidade de um homem que se vê impotente diante do inevitável. Já Claire Forlani imprime intensidade à sua Susan, traduzindo com olhares e gestos a complexidade de uma paixão que transita entre a descoberta e o desconhecido.
A narrativa se equilibra entre o drama existencial e a crítica à lógica impessoal do mundo corporativo, explorando como a vida moderna busca constantemente adiar ou disfarçar sua transitoriedade. A iminente fusão empresarial que ameaça o império de Parrish serve como metáfora para essa ânsia de permanência, contrastando com a realidade incontornável de sua condição mortal. O embate entre a efemeridade dos sentimentos e a perenidade das consequências de nossas escolhas confere densidade ao enredo, elevando o filme para além de uma simples história de amor ou despedida.
Se há uma ousadia estrutural em “Encontro Marcado”, é justamente sua recusa em se render à conveniência do ritmo acelerado que domina o cinema contemporâneo. Com quase três horas de duração, a obra exige do espectador um comprometimento com sua atmosfera contemplativa, onde cada cena se desenrola no tempo necessário para absorver suas implicações. Essa escolha pode dividir opiniões, mas reforça a intenção de transformar a experiência em algo mais do que uma narrativa convencional: trata-se de um convite à introspecção, ao questionamento sobre a natureza da existência e o que significa, de fato, estar vivo.
Diante da inevitável comparação com outras produções que abordam temas semelhantes, como “O Sexto Sentido”, “Encontro Marcado” se diferencia por sua abordagem poética da mortalidade, onde o destino não é apenas uma conclusão, mas um processo de descoberta. Seu impacto não reside em reviravoltas inesperadas, mas na forma como traduz para a tela um sentimento universal: a luta entre a necessidade de controle e a aceitação daquilo que escapa às nossas mãos.
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