Se há uma história de amor que todos deveriam assistir, ela acaba de chegar à Netflix Divulgação / Dreamworks Pictures

Se há uma história de amor que todos deveriam assistir, ela acaba de chegar à Netflix

Algumas histórias desafiam as barreiras do realismo, navegando por territórios onde o improvável se torna essencialmente humano. “E Se Fosse Verdade” pertence a essa categoria. O filme dirigido por Mark Waters combina elementos de comédia romântica e fantasia para criar uma narrativa que, embora desprovida de explicações lógicas, se ancora na emoção genuína. Elizabeth (Reese Witherspoon) e David (Mark Ruffalo) formam um casal improvável: ela, uma médica dedicada, presa entre a vida e a morte após um acidente; ele, um homem devastado pela perda da esposa, que se encontra na inusitada posição de enxergar e interagir com a presença etérea de Elizabeth. O encontro acontece de maneira inesperada: ao se mudar para o apartamento dela, David percebe que não está sozinho. Mas seria Elizabeth um fantasma? Não exatamente. O filme sugere a existência de algo entre a realidade e o esquecimento, um intervalo onde o amor pode se manifestar mesmo quando tudo parece perdido.

O enredo se desenrola sobre essa base de improbabilidade, na qual o espectador precisa aceitar o impossível sem questioná-lo. Elizabeth e David, inicialmente céticos sobre a presença um do outro, começam a se aproximar não por convenções narrativas previsíveis, mas pela necessidade mútua de se reconectar com a vida. Elizabeth, obcecada pelo trabalho, negligenciou suas próprias emoções; David, consumido pelo luto, se fechou para o mundo. A trama, que poderia facilmente recorrer a atalhos fáceis do gênero, surpreende ao permitir que essa relação cresça gradualmente, equilibrando luto e esperança. A química entre os protagonistas se sustenta em um roteiro espirituoso de Peter Tolan e Leslie Dixon, que insere diálogos inteligentes e momentos de humor para suavizar a melancolia subjacente da história.

A construção da narrativa reforça a ideia de que o amor desafia qualquer lógica, e, nesse sentido, “E Se Fosse Verdade” dialoga com romances clássicos como “O Céu Pode Esperar” (1943). O filme sugere que as conexões humanas vão além do tangível e que, muitas vezes, os encontros mais significativos acontecem nos momentos mais improváveis. A trilha sonora, a fotografia delicada de São Francisco e a direção sensível de Waters contribuem para criar um ambiente onde a fantasia não parece deslocada, mas sim uma extensão natural dos sentimentos dos personagens. Mais do que reinventar o gênero, o filme reafirma algo fundamental: o amor, em sua natureza caótica, ignora convenções e se manifesta onde menos se espera.

Embora a trama funcione dentro de sua proposta, há momentos em que sua estrutura narrativa se apoia excessivamente em coincidências e desencontros artificiais. O conceito de Idiot Plot — em que os problemas poderiam ser resolvidos com algumas frases bem colocadas — se faz presente em diversas cenas. Ainda assim, há um fascínio na frustração gerada pela hesitação dos personagens, pois ela reflete a resistência emocional que tantas vezes experimentamos na vida real. A trama poderia ser resolvida de forma mais ágil, mas a relutância dos protagonistas em aceitar o óbvio gera um envolvimento inesperado do espectador. A relação entre Elizabeth e David, inicialmente marcada por incredulidade e conflito, evolui para algo mais profundo, impulsionado pelo desejo de encontrar sentido em meio ao improvável.

A performance de Reese Witherspoon equilibra firmeza e vulnerabilidade, enquanto Mark Ruffalo constrói um David melancólico, mas cativante. O filme não se propõe a desafiar convenções narrativas nem a trazer reviravoltas inesperadas, mas compensa isso com um charme inegável e uma execução cuidadosa. Ao final, “E Se Fosse Verdade” não se destaca pela inovação, mas pela forma como resgata a ideia de que algumas histórias continuam a ser contadas porque tocam verdades essenciais. Entre realidade e fantasia, razão e emoção, o filme nos lembra que o amor não precisa fazer sentido para ser real. Talvez, como sugere seu título, a vida seja mesmo um jogo entre presenças e ausências, onde o que realmente importa é o que fazemos com o tempo que nos resta.

Filme: E se Fosse Verdade
Diretor: Mark Waters
Ano: 2005
Gênero: Comédia/Drama/Fantasia/Romance
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★