Thriller jurídico com Robert De Niro e Michelle Pfeiffer foi indicado a 4 prêmios Emmy e está na Max Divulgação / Tribeca Productions

Thriller jurídico com Robert De Niro e Michelle Pfeiffer foi indicado a 4 prêmios Emmy e está na Max

A recriação do colapso de Bernard Madoff, exposta de maneira implacável em “O Mago das Mentiras”, de Barry Levinson, é uma reflexão meticulosa sobre a transformação da ambição em um abismo moral. Ao invés de se limitar à mera exploração de um fraudador, o filme mergulha no centro da vilania, indo além da fraude financeira para revelar a frieza imperturbável de um ser humano incapaz de remorso. O desempenho de Robert De Niro, que substitui a abordagem cômica de Richard Dreyfuss, transforma Madoff de um personagem quase banal para uma figura verdadeiramente repulsiva, capaz de manipular, destruir e se convencer de sua própria impunidade. Como um mestre de orquestra, ele conduz sua fraude de uma maneira calculada, mas profundamente insensível. É um predador, meticulosamente encoberto pela fachada de respeitabilidade, sem qualquer vestígio de arrependimento.

A narrativa do filme se desenrola a partir da prisão de Madoff, tecendo flashbacks para reconstruir os eventos que levaram ao colapso de seu império de mentiras. No entanto, ao contrário de muitos relatos que buscam diluir a responsabilidade de suas vítimas mais próximas, “O Mago das Mentiras” se permite explorar as tensões familiares de maneira comovente, particularmente ao retratar Ruth Madoff (Michelle Pfeiffer). A interpretação de Pfeiffer reflete a complexidade da tragédia de uma mulher que, embora consciente de que seu marido está envolvido em algo nefasto, se vê engolida pela magnitude da fraude, até o ponto em que é impossível para ela discernir até onde ele a havia levado.

A análise do sistema financeiro, e a aparente impunidade de Madoff diante do caos que causou, é um dos pontos de maior profundidade do filme. A ironia de sua sentença de 150 anos de prisão, enquanto outros golpes financeiros igualmente devastadores, como o colapso da Enron ou os crimes cometidos durante a crise de 2008, ficam praticamente impunes, expõe a fragilidade do conceito de justiça. A verdadeira razão para sua queda não parece ter sido a falência de seus investidores anônimos, mas sim a injustiça de ter prejudicado aqueles com poder de retaliação. É o sistema em si que falha, proporcionando uma análise desconfortante sobre a disparidade entre aqueles que estão acima da lei e os que caem por sua falta de compaixão.

Em sua construção, o filme tenta balancear o drama psicológico com uma narrativa que, embora envolvente, falha em manter sua coesão total. O roteiro, muitas vezes fragmentado, é uma tentativa de balancear momentos de introspecção com a trama de um grande escândalo financeiro. No entanto, “O Mago das Mentiras” sofre com uma estrutura que acaba se tornando excessivamente repetitiva e se distancia da complexidade que poderia ter sido explorada. O filme se arrasta por um último ato onde a tensão do colapso de Madoff e sua família se torna previsível, arrastando o espectador sem um sentido claro de progressão. A ideia de criar um estudo psicológico aprofundado de um personagem imerso no autoengano, como Madoff, se perde na repetição de momentos já vistos.

A tragédia familiar também marca o coração do filme. A tentativa de suicídio do casal, falhando miseravelmente, é um momento de desconexão quase tragicômica. Há uma ironia pungente quando, ao tentar encerrar suas vidas, a noite se arrasta e a realidade retorna no amanhecer. A inclusão de Judy Garland em “Have Yourself a Merry Little Christmas”, um detalhe aparentemente banal, carrega um peso simbólico que ressoa profundamente na desconstrução da vida que eles tentam desesperadamente esconder. A falha em lidar com a gravidade do colapso financeiro e a ignorância da esposa quanto à extensão do esquema fraudulento demonstram uma desconexão total com a realidade, ressaltada pela dificuldade de Ruth em entender os danos irreparáveis que Madoff causou.

Apesar da força das atuações e da poderosa imagem de Madoff como um sociopata imune à culpa, “O Mago das Mentiras” não consegue alcançar a coesão narrativa que sua trama exige. Embora funcione como uma denúncia contundente do poder do dinheiro, o filme se arrasta por um ritmo excessivo e uma fragmentação que prejudica a totalidade de seu impacto. A jornada de Madoff no inferno pessoal e familiar deveria ser mais do que uma catarse, mas acaba se tornando um exercício de exaustão. A estrutura incoerente desvia o olhar da complexidade que poderia ter sido explorada em um retrato ainda mais inquietante do impacto da fraude e da moralidade distorcida de Madoff.

Se por um lado, “O Mago das Mentiras” oferece um lembrete angustiante da impunidade de muitos que cometem fraudes financeiras de grande escala, por outro lado, sua falha em construir uma narrativa coesa impede que o filme atinja seu potencial de se tornar uma referência no gênero. A falta de uma organização mais sólida enfraquece o impacto emocional, mas o filme ainda se mantém relevante, principalmente pela construção do personagem de Madoff, que emerge como uma figura vazia, corrompida por um sistema que alimenta sua ilusão de grandeza.

Filme: O Mago das Mentiras
Diretor: Barry Levinson
Ano: 2017
Gênero: Biografia/Crime/Drama
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★