Ao longo das décadas, “Jane Eyre” tem sido revisitada inúmeras vezes no cinema e na televisão, cada adaptação moldada por sua época e pela visão de seus realizadores. A versão de 2011, dirigida por Cary Fukunaga, busca um equilíbrio entre fidelidade ao romance de Charlotte Brontë e um olhar renovado sobre essa narrativa gótica. Com um tratamento visual que valoriza a luz natural e uma atmosfera soturna que acentua a melancolia da trama, o filme se destaca por sua abordagem autêntica e envolvente, ainda que apresente desafios na construção da relação central entre Jane e Rochester.
A direção de Fukunaga se diferencia ao privilegiar uma fotografia sem artifícios excessivos, utilizando velas e luz natural para compor um ambiente visualmente impactante, em que Thornfield Hall emerge como um personagem próprio: imponente, sombrio e carregado de segredos. Esse rigor estético contribui para a imersão do espectador na atmosfera gótica da narrativa, evitando o polimento excessivo que muitas adaptações de período apresentam. O diretor também emprega uma abordagem de flashbacks, o que confere dinamismo à trama, mas pode tornar-se confuso para aqueles que não estão familiarizados com a história original.
O elenco, por sua vez, é um dos trunfos da produção. Mia Wasikowska entrega uma interpretação convincente de Jane, equilibrando fragilidade e determinação sem cair no sentimentalismo excessivo. Seu aspecto físico também reforça a verossimilhança da personagem, fugindo do estereótipo de heroína glamourosa que tantas vezes destoa das descrições literárias. Judi Dench, mesmo em um papel secundário como a Sra. Fairfax, demonstra seu talento ao transmitir nuances emocionais em cenas de impacto silencioso, contribuindo para a riqueza da narrativa. Já Michael Fassbender, no papel de Rochester, possui a presença magnética necessária para um personagem tão complexo, ainda que sua abordagem o torne menos reservado e misterioso do que outras interpretações do papel. A escolha de Jamie Bell como St. John Rivers, no entanto, parece pouco inspirada, tanto por suas diferenças físicas em relação à descrição do livro quanto pela ausência de um senso convincente de fervor missionário.
Se por um lado o filme impressiona pela atmosfera e atuações, por outro, sua duração limitada impõe restrições à construção do relacionamento entre Jane e Rochester. A rapidez com que os eventos se desenrolam faz com que a profundidade da conexão entre os protagonistas seja menos explorada, dificultando a percepção do que, de fato, os leva a se apaixonarem. O roteiro também omite alguns dos diálogos mais icônicos do livro, o que pode decepcionar os fãs da obra original. Ainda assim, a intensidade emocional presente nas interações entre Jane e Rochester garante momentos de impacto genuíno, mesmo que o desenvolvimento da relação pudesse ser mais gradual e convincente.
A versão de Fukunaga de “Jane Eyre” é uma experiência cinematográfica visualmente deslumbrante, que se beneficia de um elenco talentoso e de uma direção cuidadosa na construção de sua atmosfera. Embora alguns aspectos da narrativa possam parecer apressados ou incompletos, a essência da história permanece intacta, proporcionando uma abordagem envolvente e digna da riqueza do material original. Para os admiradores de adaptações literárias que priorizam a estética e a ambientação, este filme se firma como uma das versões mais belas e imersivas da obra-prima de Brontë.
★★★★★★★★★★