Desde 1968, qualquer tentativa de retratar a jornada humana para além do familiar berço terrestre inevitavelmente se mede pelo impacto de “2001: Uma Odisseia no Espaço”. O feito de Stanley Kubrick transcende a própria ideia de um cinema de ficção científica convencional, estabelecendo um paradigma que muitos aspiram alcançar, mas poucos sequer arranham. Entre aqueles que se aproximam desse panteão, despontam Alfonso Cuarón e sua minuciosa abordagem da deriva espacial em “Gravidade” (2013), Ridley Scott e sua fé inabalável na engenhosidade humana em “Perdido em Marte” (2015) e Daniel Espinosa, que em “Life” (2017) resgata a angústia da sobrevivência no vácuo. Cada um, com suas particularidades, tenta encontrar um espaço nesse cosmos simbólico que Kubrick ergueu com maestria.
A essa lista junta-se Christopher Nolan, um cineasta cuja obsessão pela dimensão temporal parece tão ilimitada quanto o próprio universo que explora em “Interestelar”. Seu filme, mais do que uma narrativa sobre a necessidade de migração para além dos limites planetários, é uma investigação sobre o que nos prende à Terra: laços afetivos, perda e a impossibilidade de reverter o curso da existência. Em meio ao colapso ambiental iminente, Nolan e seu irmão Jonathan, corroteirista, desenham uma história de despedidas, onde a distância entre entes queridos é ampliada ao extremo pela vastidão do espaço e pela dilatação temporal. O protagonista, Cooper, vivido por Matthew McConaughey, carrega um paradoxo: é aquele que busca a sobrevivência da espécie, mas que, ao partir, rompe o vínculo mais humano de todos, o de pai e filha.
A bordo da Endurance, Cooper divide sua missão com Amelia Brand, interpretada por Anne Hathaway, cientista cujos conflitos internos orbitam a relação truncada com um pai brilhante e distanciado. Ambos percorrem uma jornada onde a sobrevivência física se entrelaça à emocional, enquanto enfrentam um destino em que escolhas são irreversíveis e o retorno à origem se torna um conceito fluido. Nolan costura essa narrativa repleta de reviravoltas com sua tradicional preocupação estrutural, embora por vezes sacrificando a espontaneidade em prol da grandiosidade conceitual.
Jessica Chastain assume a personificação da passagem do tempo ao dar vida a Murphy, filha de Cooper, cujo amadurecimento é impulsionado pela ausência do pai e pela obsessiva busca por respostas. Enquanto isso, o filme se aprofunda na ideia de que, por mais avançada que seja a tecnologia, o que nos move não é a exploração do desconhecido, mas a tentativa de restabelecer conexões perdidas. Entre um salto interdimensional e outro, Nolan provoca reflexões sobre a efemeridade do presente e a angústia do desencontro, tema que, tratado com menos pretensão e maior acuidade emocional, encontrou em “Perdido em Marte” uma execução mais concisa e envolvente.
★★★★★★★★★★