Nicolas Cage como Drácula? Sim! E você pode ver agora na Netflix. O filme de vampiros mais insano dos últimos anos Divulgação / Universal Pictures

Nicolas Cage como Drácula? Sim! E você pode ver agora na Netflix. O filme de vampiros mais insano dos últimos anos

Histórias sobre criaturas que emergem das trevas para assombrar os vivos são tão antigas quanto a própria civilização. No entanto, a construção da mitologia vampírica no cinema ganhou impulso decisivo há quase um século, quando Tod Browning (1880-1962) e Karl Freund (1890-1969) iniciaram uma jornada cujo alcance talvez nem pudessem conceber. Embora “Nosferatu” (1922), de F. W. Murnau (1888-1931), tenha sido a primeira grande incursão cinematográfica na figura do vampiro, foi em “Drácula” (1931), sob a condução de Browning e Freund, que o público testemunhou com clareza o magnetismo e a perenidade desse arquétipo. O tempo, longe de diluir seu fascínio, apenas expandiu suas ramificações, garantindo sua permanência e reinvenção sob as mais variadas perspectivas.

“Renfield — Dando Sangue Pelo Chefe” revisita o infame Empalador por uma ótica inusitada, deslocando o foco para um de seus mais leais e atormentados servos. Na abordagem cômica de Chris McKay, a narrativa amplia-se a ponto de fazer de Robert Montague Renfield a verdadeira peça central da história. Essa inversão de protagonismo não ocorre por mero capricho, mas por uma necessidade estrutural que permite explorar as implicações emocionais e psicológicas do vínculo entre mestre e subordinado. Desde o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), Renfield carrega o fardo de sua servidão ao Príncipe das Trevas, e é essa condição de escravidão involuntária que o diretor disseca com meticulosa atenção.

Antes de cair na armadilha das leituras simplistas, é essencial compreender por que algumas figuras históricas acumulam em torno de si camadas densas de polêmica, sem que isso signifique a absolvição de seus atos. No caso dos vampiros, o que mais intriga é a justaposição entre sua faceta mitológica e suas possíveis dimensões humanas. Drácula, por exemplo, oscila entre a imagem do guerreiro destemido e do patriarca ferozmente protetor, cuja lealdade aos seus não hesitava em transbordar em violência extrema. Essa ambiguidade moral, permeada por lendas e distorções, mantém sua presença fascinante na cultura popular, perpetuando-se através das mais diversas leituras.

Adaptando um argumento concebido por Robert Kirkman, os roteiristas Ryan Ridley e Ava Tramer moldam um Renfield que poderia ser esculpido em mármore, como os anjos funestos que adornam cemitérios. Sua juventude eterna não carrega brilho ou deslumbramento, mas um cansaço irremediável, o desgaste acumulado de décadas sob a sombra opressora de seu mestre. Nicolas Cage, embora interprete o próprio Drácula, assume uma postura quase discreta ao longo dos 93 minutos de projeção, cedendo espaço para que Nicholas Hoult conduza a narrativa com segurança. Ele transita com naturalidade entre o desespero latente de Renfield, refletido na fotografia esverdeada de Mitchell Amundsen, e o estranho encanto de sua relação com Rebecca Quincy, policial vivida por Awkwafina com a vivacidade habitual. O resultado é uma mistura singular de horror e humor, que preserva a aura trágica do protagonista sem abrir mão da ironia que o liberta.

Filme: Renfield — Dando Sangue Pelo Chefe
Diretor: Chris McKay
Ano: 2023
Gênero: Comédia/Terror
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★