Um dos maiores clássicos do cinema, vencedor de 3 Oscars, no Prime Video Divulgação /Metro-Goldwyn-Mayer Studios

Um dos maiores clássicos do cinema, vencedor de 3 Oscars, no Prime Video

Poucos filmes conseguem equilibrar, com tamanha maestria, a carga emocional, o humor refinado e a profundidade histórica como “Um Violinista no Telhado”. Baseado nos escritos de Sholom Aleichem sobre Tevye, um leiteiro judeu que se vê desafiado a preservar sua identidade em meio às mudanças sociais e políticas da Rússia czarista, o longa dirigido por Norman Jewison amplia a essência do musical da Broadway e a transforma em uma experiência cinematográfica de grande impacto. A condução de Jewison, a fotografia evocativa de Oswald Morris e a performance marcante de Chaim Topol elevam o filme a um patamar que transcende sua narrativa particular e o inscreve como uma reflexão universal sobre tradição, resistência e transformação.

A abertura com a icônica “Tradição” estabelece, de imediato, a força do tema central. O número musical não apenas introduz o dilema do protagonista, mas sintetiza, de forma espirituosa e envolvente, a dinâmica de uma comunidade que se equilibra entre o passado e um futuro incerto. A coreografia meticulosamente integrada ao cotidiano dos personagens transforma gestos triviais em um espetáculo coreografado de pertencimento cultural. Esse jogo entre teatralidade e realismo, marca registrada da abordagem de Jewison, permeia toda a obra. O conflito central, simbolizado pelas escolhas matrimoniais das filhas de Tevye e sua resistência inicial a elas, reflete uma tensão inevitável: a necessidade de adaptação sem perder as raízes. Esse embate, porém, não se restringe ao ambiente doméstico, mas ecoa na esfera política, à medida que o filme revela um contexto de crescente perseguição aos judeus, culminando em um desfecho que, mesmo doloroso, mantém intacta a dignidade dos personagens.

“Um Violinista no Telhado” impressiona pela reconstrução meticulosa do shtetl, cenário que emerge não como mero pano de fundo, mas como elemento vivo da narrativa. Filmado em uma vila na antiga Iugoslávia para garantir autenticidade, o longa supera desafios logísticos — incluindo a ausência da neve desejada por Jewison — para entregar uma ambientação que respira veracidade. Essa busca pelo realismo se estende às atuações, com Topol oferecendo um Tevye inesquecível, oscilando entre comicidade, sabedoria e melancolia com uma naturalidade rara em musicais. Sua presença magnética garante que, mesmo nos momentos mais lúdicos, a humanidade do personagem nunca se perca.

A trilha sonora de Jerry Bock não se limita a embelezar a narrativa, mas a impulsiona. As melodias, inspiradas no folclore judaico e na tradição dos musicais da Broadway, oferecem mais do que entretenimento; elas reforçam estados emocionais e aprofundam as reflexões do filme. “Se Eu Fosse Rico” encapsula, com uma dose precisa de ironia, os anseios de Tevye, enquanto “Nascer do Sol, Pôr do Sol” traduz, com lirismo pungente, a efemeridade do tempo. “Matchmaker” acrescenta leveza ao dilema das jovens protagonistas sem perder a sutileza da crítica às convenções sociais. A maneira como cada canção se insere organicamente na trama revela o cuidado da direção em preservar a unidade narrativa sem transformar o filme em uma sequência de números desconexos.

Além da sofisticação estética e narrativa, “Um Violinista no Telhado” se vale de simbolismos que ampliam sua força dramática. A figura do violinista, inspirada no imaginário das pinturas de Marc Chagall, sintetiza a instabilidade da existência judaica naquele período: um equilíbrio delicado entre esperança e adversidade. Jewison emprega esse recurso com sensibilidade, ora como metáfora do espírito resiliente da comunidade, ora como um elemento quase mítico que perpassa a história. A escolha de filtros na fotografia de Morris adiciona uma textura onírica à imagem, acentuando a sensação de que o filme se move entre o real e o memorialístico, entre a tangibilidade da vida e a imortalidade das tradições.

Com uma duração que exige imersão, “Um Violinista no Telhado” recompensa seu público com uma experiência cinematográfica de profundidade singular. O impacto emocional que proporciona não se restringe à sua época; permanece atual na maneira como aborda pertencimento, mudança e identidade. Não se trata apenas de um musical brilhante, mas de uma obra que testemunha, com rara sensibilidade, a tensão entre preservar e evoluir. Jewison, ao traduzir a peça para o cinema, não apenas respeita seu material de origem, mas o expande, garantindo que sua relevância perdure por gerações. O resultado é um clássico incontestável, que, mais do que emocionar, instiga e ressoa como um lembrete da força do espírito humano frente às incertezas da história.

Filme: Um Violinista no Telhado
Diretor: Norman Jewison
Ano: 1971
Gênero: Drama/História/Musical
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★