Dirigido por Edward Norton, último grande filme de Bruce Willis está na Max Divulgação / Warner Bros.

Dirigido por Edward Norton, último grande filme de Bruce Willis está na Max

Edward Norton sempre demonstrou um apreço singular por personagens complexos e roteiros que desafiam convenções narrativas. Em “Brooklyn Sem Pai Nem Mãe”, ele não apenas interpreta o protagonista, mas também assume a direção e a adaptação do romance de Jonathan Lethem, empreendendo uma reconstrução meticulosa do noir clássico sob uma lente contemporânea. O longa se apoia em uma atmosfera densa, onde mistério, corrupção e jazz se entrelaçam em uma trama que resgata a essência do gênero sem se tornar refém de suas convenções.

A história se passa na Nova York dos anos 1950 e acompanha Lionel Essrog (Norton), um detetive particular cujo raciocínio aguçado contrasta com os impulsos incontroláveis da síndrome de Tourette. Quando seu mentor, Frank Minna (Bruce Willis), é assassinado, Lionel embarca em uma investigação que o conduz aos bastidores sombrios do poder. O caminho é povoado por figuras magnéticas, interpretadas por Willem Dafoe, Gugu Mbatha-Raw, Cherry Jones, Bobby Cannavale e Alec Baldwin. Este último encarna um magnata cuja filosofia urbanística impiedosa espelha os interesses obscuros que moldam a cidade. A narrativa se desdobra não apenas como um mistério, mas como um olhar minucioso sobre exclusão social, ambição e o choque entre progresso e desumanização.

O grande diferencial do filme reside na atuação de Norton. Ele confere ao protagonista uma autenticidade rara, evitando caricaturas ao retratar os tiques e compulsões da condição neurológica. Lionel é um personagem que navega entre vulnerabilidade e sagacidade, e Norton dosa cada expressão com precisão cirúrgica. O elenco coadjuvante fortalece essa imersão, com Baldwin canalizando um cinismo frio que sintetiza a indiferença dos poderosos. O filme ainda utiliza a voz do protagonista não apenas como recurso expositivo, mas como ferramenta estilística que amplifica o tom noir da narrativa.

A ambientação é um dos elementos mais fascinantes. O jogo de luz e sombra, característico do gênero, é explorado com rigor, criando composições visuais que remetem a clássicos do cinema noir. A reconstrução digital da antiga Penn Station evoca a grandiosidade perdida da cidade, servindo como metáfora da transformação brutal imposta pelos interesses políticos e econômicos. O jazz, além de pontuar a trilha sonora, é incorporado organicamente à narrativa, refletindo tanto a inquietude do protagonista quanto a pulsante efervescência de uma Nova York em mutação.

Apesar de suas inegáveis qualidades, o ritmo deliberado e os diálogos extensos podem não agradar a todos. A abordagem detalhista privilegia a construção de atmosfera e personagens, em detrimento de soluções rápidas ou reviravoltas abruptas. Contudo, para os apreciadores de narrativas ricas em camadas e nuances, a obra se destaca como uma experiência cinematográfica envolvente e recompensadora.

Distante de meras homenagens, “Brooklyn Sem Pai Nem Mãe” reinterpreta o noir com personalidade própria. Norton presta tributo ao gênero sem se prender a fórmulas desgastadas, entregando um filme que dialoga tanto com clássicos como “Chinatown” e “Los Angeles — Cidade Proibida” quanto com uma audiência contemporânea que busca narrativas inteligentes e esteticamente refinadas. O resultado é uma obra que, mesmo evocando o passado, se impõe como uma das incursões mais autêuticas no gênero noir nos últimos anos.

Filme: Brooklyn: Sem Pai Nem Mãe
Diretor: Edward Norton
Ano: 2019
Gênero: Crime/Drama/Mistério
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★