Mel Gibson e a brasileira Alessandra Ambrósio juntos na comédia mais inusitada da Netflix — impossível não rir Divulgação / Paramount Pictures

Mel Gibson e a brasileira Alessandra Ambrósio juntos na comédia mais inusitada da Netflix — impossível não rir

Se a aposta inicial de Sean Anders em “Pai em Dose Dupla” girava em torno da improvável interação entre Will Ferrell e Mark Wahlberg, na sequência o diretor não apenas preserva sua fórmula de sucesso como também a expande com astúcia. Ao inserir duas figuras veteranas do cinema, John Lithgow e Mel Gibson, ele amplia o escopo da comédia, trazendo um embate de gerações que reforça os contrastes já estabelecidos entre Brad Whitaker e Dusty Mayron. O roteiro de Anders, Brian Burns e John Morris mantém sua natureza convencional, oscilando entre momentos de autenticidade cômica e construções mais artificiais, mas assume um risco calculado ao descentralizar os protagonistas originais e focar na dinâmica entre Don e Kurt, os patriarcas que chegam para movimentar um Natal já suficientemente caótico.

A entrada de Lithgow e Gibson poderia facilmente resvalar em caricatura, mas a direção equilibrada de Anders impede que o filme se transforme em um exercício de clichês. Kurt, um ex-astronauta que se dedica a uma vida hedonista e repleta de conquistas românticas, surge como o contraponto absoluto a Don, um carteiro aposentado que personifica o arquétipo do sujeito afável e prestativo. Essa oposição se desenha logo na chegada dos dois ao aeroporto: enquanto Don se sensibiliza com o drama de um entregador sobrecarregado, Kurt desfila sua autoconfiança desdenhosa. Esse choque de posturas define muito do humor do filme, que brinca com as tensões entre uma masculinidade tradicionalista e outra mais sentimentalizada sem pender para extremos previsíveis.

A relação entre os dois novos avôs, marcada por atração e repulsa, ganha um tempero adicional com a complexidade das relações familiares. A ideia de compartilharem a função de “coavôs” de Megan e Dylan, filhos de Dusty e Sarah criados também por Brad, além de Griffy, filho de Brad e Karen, se traduz para Kurt em um dilema quase existencial, enquanto Don se entrega à situação com entusiasmo pueril. A reviravolta sentimental de Dusty, que abandona sua postura de lobo solitário para um namoro estável com Karen, adiciona outra camada ao enredo, trazendo um gosto agridoce ao seu destino: se antes zombava da estabilidade de Brad, agora ele próprio se vê enredado pelas mesmas amarras.

A decisão das famílias de passar as festas de fim de ano em um chalé nas montanhas inaugura a fase mais previsível do filme. A ambientação sugere um catálogo de incidentes típicos desse tipo de comédia, desde o desastre com uma máquina de remoção de neve — ecoando a destruição da Superleggera no primeiro filme — até a sequência de caça ao peru, que por pouco não se transforma em uma tragédia. O humor físico predomina, mas encontra uma exceção notável na cena do baile de pais e filhas, onde a sátira ao politicamente correto adiciona um toque de provocação bem-vindo à narrativa.

Scarlett Estevez e Owen Vaccaro continuam carismáticos, enquanto Linda Cardellini finalmente encontra espaço para demonstrar a expressividade que a destacou em “O Segredo de Brokeback Mountain” e reafirmou em “Green Book: O Guia”. Em contrapartida, algumas participações especiais soam forçadas e constrangedoras. Alessandra Ambrósio e sua obsessão por uma caderneta, John Cena e até mesmo Chesley “Sully” Sullenberger — figura que inspirou um dos mais interessantes dramas biográficos de Clint Eastwood — não encontram propósito real dentro da trama, funcionando mais como distrações do que adições genuinamente cômicas.

No conjunto, “Pai em Dose Dupla 2” conserva sua proposta de humor familiar, equilibrando momentos de comédia ágil com outros que tropeçam na previsibilidade. O filme se beneficia do talento de seu elenco veterano, que injeta carisma em situações que poderiam facilmente parecer genéricas, e do olhar atento de Anders para extrair humor das pequenas tragédias do convívio familiar. A aposta em expandir o universo da história funciona dentro dos limites de sua premissa, mas sem o frescor do original, a sequência depende mais do carisma de seus intérpretes do que da inovação narrativa. O saldo, ainda assim, é positivo: um filme que entrega o que promete, mesmo sem ir além do esperado.

Filme: Pai em Dose Dupla 2
Diretor: Sean Anders
Ano: 2017
Gênero: Comédia/Drama
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★