A derrocada de qualquer pretensão humana é um veneno que se infiltra sem pedir permissão, corroendo silenciosamente até a última fibra de esperança. No entanto, há aqueles que, diante de sucessivas derrotas, atingem um ponto de exaustão emocional onde a desistência se torna um reflexo instintivo. Como se o horizonte deixasse de prometer qualquer possibilidade, como se a roda da fortuna estivesse enfim emperrada. E, então, em um movimento que parece tanto um ato de desespero quanto de desafio, o destino se adianta, oferecendo não uma redenção, mas um novo embate. “A Céu Aberto” acompanha três figuras que, tomados pela falácia do último recurso, cruzam a fronteira entre os Estados Unidos e o México movidos por um intento que oscila entre o heroico e o delinquente.
Ao marcar presença no Festival Internacional de Cinema de Toronto (TIFF), “A Céu Aberto” se insere em um circuito onde qualidade narrativa é requisito básico. A direção fica a cargo de Mariana e Santiago Arriaga, que, seguindo o legado do pai, Guillermo Arriaga — a mente por trás de “Babel” (2006) e “Amores Brutos” (2000) —, assumem um projeto ambicioso, mas não sem respaldo. A escrita, obsessivamente burilada, traduz um olhar minucioso sobre a psicologia de seus personagens e a brutalidade latente do mundo em que estão inseridos. Não à toa, Guillermo assina o roteiro, conferindo a este primeiro grande ensaio dos filhos um peso que ultrapassa a mera sucessão familiar.
No início dos anos 1990, um pai e seu filho, Fernando e Salvador, partem para Coahuila, um recanto do México onde o deserto impõe regras silenciosas. O que deveria ser uma experiência marcante se desfaz num estalo: um caminhão sem freios corta a estrada e atravessa a história como um gume. O impacto, tanto literal quanto figurado, é uma assinatura do patriarca Arriaga, reaproveitada por Mariana e Santiago como a fagulha que move toda a narrativa. Salvador sobrevive, mas é um homem quebrado pelo tempo. Dois anos depois, Fernando, o irmão mais velho, descobre o paradeiro do motorista que conduzia o veículo, Lucio, e decide ir ao encontro do passado não para compreendê-lo, mas para eliminá-lo.
A estrutura dramática se ergue sobre a relação conflituosa entre Salvador, Fernando e Lucio, interpretados por Theo Goldin, Máximo Hollander e Julio Cesar Cedillo. Sem pressa para despejar revelações, a trama costura tensões e omissões que tornam cada decisão uma aposta cega. O envolvimento de Paula (Federica Garcia) e Eduardo (Sergio Mayer Mori), além de adicionar uma camada de instabilidade emocional, amplifica o senso de urgência. Guillermo Arriaga, sempre meticuloso, intercala momentos de leveza em forma de dialetos locais, referências musicais e publicidade dos anos 90, criando um retrato autêntico do período. Entretanto, sob toda essa composição estética e narrativa, subsiste a angústia da inocência sendo engolida por um tempo que não perdoa.
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