Suspense com Richard Gere indicado ao Oscar que está na Netflix DIvulgação / Regency Enterprises

Suspense com Richard Gere indicado ao Oscar que está na Netflix

Poucos filmes abordam a infidelidade conjugal com a complexidade emocional e a profundidade psicológica que “Infidelidade” alcança. Sob a direção de Adrian Lyne, a narrativa vai além do clichê da traição para dissecar as contradições e impulsos que definem a natureza humana. Diane Lane interpreta Connie Sumner, uma mulher cujo casamento com Edward (Richard Gere) segue o curso previsível da estabilidade, mas sem a fagulha que outrora o incendiava. Um encontro fortuito com Paul Martel (Olivier Martinez), jovem e sedutor, desestabiliza essa aparente harmonia e a conduz a uma relação extraconjugal que oscila entre desejo, culpa e autoengano.

Connie não se entrega a Paul por amor, tampouco por insatisfação explícita com o marido. Sua traição acontece como uma resposta visceral a um desejo inesperado, quase incontrolável. A relação com Paul é física, impulsiva, enquanto o vínculo com Edward, ainda sólido, se vê corroído pela previsibilidade e pelo desgaste cotidiano. Inspirado no filme francês “A Mulher Infiel”, de Claude Chabrol, o roteiro não se limita a narrar os eventos da traição, mas sim a mapear suas consequências inescapáveis, evitando soluções ou juízos morais simplistas.

Diane Lane entrega uma performance excepcional, conduzindo a protagonista por um labirinto de emoções conflitantes. Uma das cenas mais marcantes ocorre dentro de um trem, após um encontro com Paul. Sem diálogos expositivos, apenas pela linguagem corporal e pelas sutis oscilações em seu olhar, a atriz comunica um misto de excitação, arrependimento e inquietação, traduzindo com precisão a turbulência interna da personagem. Essa atuação lhe rendeu uma indicação ao Oscar e reafirmou sua posição como uma intérprete de nuances raras. Richard Gere, por sua vez, opta por uma abordagem contida para Edward, expressando sua dor e perplexidade de maneira contida, mas devastadora. Sua reação ao descobrir a traição é um dos pontos altos do filme, fugindo do convencional e mergulhando em uma complexidade inesperada.

O olhar meticuloso de Lyne se estende à construção visual do filme, reforçando a tensão emocional com escolhas estéticas precisas. A primeira cena, marcada pelo vento forte, prenuncia a tempestade emocional que se aproxima. A alternância entre a frieza da vida doméstica e o calor dos encontros proibidos é trabalhada com uma fotografia calculada, intensificando o impacto psicológico da narrativa. No entanto, em alguns momentos, o simbolismo se torna excessivamente óbvio, e a transição do drama psicológico para o suspense no terceiro ato altera temporariamente a sobriedade que sustenta a maior parte da obra.

A construção dos personagens evita maniqueísmos. Inicialmente, a narrativa convida o espectador a compreender Connie, suas carências e sua necessidade de reviver a intensidade do desejo. Contudo, conforme a trama avança, sua postura revela um lado mais egoísta e destrutivo. A frieza com que se distancia de Edward, suas omissões calculadas e sua recusa em encarar as consequências imediatas de seus atos demonstram que, embora não seja uma vilã, suas escolhas reverberam de maneira devastadora. O filme não busca redenção ou punição tradicionais; ao contrário, investe na ambiguidade moral e nas cicatrizes silenciosas que a traição deixa para além do ato consumado.

“Infidelidade” não se enquadra na categoria de thrillers passionais como “Atração Fatal”, também dirigido por Lyne, que apostam em reviravoltas explosivas. Aqui, a abordagem é mais sutil, dolorosamente realista. O adultério não é tratado como uma mera transgressão, mas como um catalisador que expõe as rachaduras invisíveis de um relacionamento supostamente inabalável. O desfecho se mantém fiel a essa perspectiva, optando por uma conclusão aberta, sem respostas definitivas, mas carregada de implicações. Mais do que entreter, o filme instiga e perturba, fazendo com que sua complexidade ressoe muito além dos créditos finais.

Filme: Infidelidade
Diretor: Adrian Lyne
Ano: 2002
Gênero: Drama/Romance/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★