Acaba de chegar à Netflix: a comédia que vai te fazer querer passar o sábado de carnaval de frente para a TV Divulgação / Netflix

Acaba de chegar à Netflix: a comédia que vai te fazer querer passar o sábado de carnaval de frente para a TV

Nos confins inóspitos da Noruega, onde o Birken se impõe como um teste de resistência quase mítico, “O Caminho Errado” encontra sua força na intersecção entre o desgaste emocional e a necessidade de reinvenção. Emilie, uma jovem mãe imersa no caos de escolhas impulsivas e consequências sufocantes, é desafiada pelo irmão, Gjermund, a atravessar os 54 quilômetros da lendária maratona de esqui. O convite é, na verdade, um ultimato: um percurso físico que se desdobra como um espelho brutal de sua própria trajetória errante.

A trajetória de Emilie é marcada por uma espiral de incertezas. Incapaz de manter estabilidade profissional, habituada a viver à sombra da própria irresponsabilidade e a refugiar-se em escapismos como o álcool, ela parece incapaz de oferecer à filha, Lilli, um ambiente seguro e estruturado. Sua relação com o ex-marido, Joachim, adiciona outra camada de tensão: enquanto ele se encanta por uma influenciadora de esqui, passa a considerar lutar pela guarda da filha, questionando a capacidade de Emilie como mãe. O empurrão definitivo para a transformação vem de Gjermund, o irmão cuja paciência se esgota. Sem mais espaço para complacência, ele oferece duas opções: enfrentar a corrida ou encontrar um novo rumo por conta própria.

A proposta soa absurda. Emilie não tem preparo, nem físico nem emocional, para um desafio de tal magnitude. Mas, aos poucos, a possibilidade de reconstrução se insinua em sua mente. O roteiro se equilibra entre a duração extenuante da maratona e o desgaste de uma vida sem direção. A corrida se torna, então, um paralelo de sua própria luta interna: cada metro percorrido é um embate contra seus velhos padrões de autossabotagem.

O filme se fortalece ao explorar os conflitos ao redor de Emilie. Gjermund, interpretado por Trond Fausa, transmite estoicismo e exasperação na medida certa, especialmente ao lado da esposa, Silje, cuja frustração pela dificuldade de engravidar ressoa em um subtexto silencioso, mas poderoso. O humor, ainda que discreto, emerge nos momentos em que Silje observa Emilie com um misto de censura e resignação, uma relação que adiciona camadas autênticas à narrativa.

A Noruega assume um papel que transcende a simples ambientação. As paisagens cobertas de neve não são meros cenários, mas espelhos das dificuldades e conquistas da protagonista. O percurso gélido e implacável ressoa com suas batalhas internas, transformando cada queda e cada retomada em um símbolo da resiliência necessária para se reinventar. O design sonoro acentua esse percurso, capturando desde a respiração ofegante até o som cortante dos esquis sobre a neve, mergulhando o espectador na exaustão e na urgência do momento.

Se “O Caminho Errado” não busca subverter estruturas narrativas convencionais, encontra seu brilho na humanização de sua protagonista. Emilie é um retrato complexo de fracasso e esperança, um lembrete de que a reabilitação não acontece em soluções fáceis, mas na decisão de seguir adiante, um passo de cada vez. Ada Eide entrega uma atuação que equilibra vulnerabilidade e determinação, tornando palpável cada dilema, cada pequena vitória ao longo da jornada.

Na reta final, a questão deixa de ser se Emilie cruzará a linha de chegada. O verdadeiro clímax está na consciência de que, pela primeira vez, ela se permite enxergar um futuro que não seja definido por fugas ou fracassos. “O Caminho Errado” não reinventa o gênero, mas entrega uma história sincera e envolvente, onde a previsibilidade não é um demérito, mas um conforto: a certeza de que, mesmo nos caminhos mais tortuosos, ainda há espaço para recomeçar.

Filme: O Caminho Errado
Diretor: Hallvar Witzø
Ano: 2025
Gênero: Comédia
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★