O amor, quando reduzido a um jogo de interesses, revela sua face mais cômica e, por vezes, mais cruel. No cinema, a comédia romântica sempre soube explorar essa dualidade, expondo o ridículo dos relacionamentos sem jamais desacreditar no poder irresistível da paixão. “Como Perder um Homem em 10 Dias”, dirigido por Donald Petrie, transforma essa ideia em um campo de batalha onde manipulação, ironia e equívocos se acumulam, levando dois personagens a um inevitável embate sentimental. Baseado livremente no livro de Michele Alexander e Jeannie Long, que mais se assemelha a um guia de comportamentos femininos a serem evitados do que a uma narrativa propriamente dita, o filme de 2003 encontrou na química de Kate Hudson e Matthew McConaughey um dos pilares de seu sucesso duradouro.
A trama se desenrola a partir de uma premissa que flerta com o absurdo, mas que se torna irresistível justamente por sua improbabilidade. De um lado, Andie Anderson (Kate Hudson), uma jornalista que escreve para a revista feminina “Composure” e que, em busca de reconhecimento profissional, aceita um desafio peculiar: elaborar uma matéria detalhando os comportamentos femininos que afastam os homens, conduzindo um experimento no qual tentará sabotar intencionalmente um relacionamento.
Para isso, precisa encontrar um parceiro desavisado que sirva como cobaia. Do outro, Ben Barry (Matthew McConaughey), um publicitário carismático que busca conquistar uma conta milionária na agência onde trabalha. Para convencer seu chefe de que entende as mulheres, aposta que conseguirá fazer qualquer uma delas se apaixonar por ele em apenas dez dias. O destino, ou a malícia do roteiro, coloca ambos no caminho um do outro, e o que se segue é um espetáculo de manipulação mútua, em que cada um tenta, sem saber das intenções do outro, levar sua aposta até o fim.
A comédia ganha força na sucessão de estratégias absurdas que Andie emprega para transformar Ben no namorado mais infeliz do mundo. Ela invade seu apartamento, impõe uma decoração infantilizada em tons de rosa, exagera na carência e até adota um cachorro para ele cuidar. Em contrapartida, Ben se esforça para suportar cada uma dessas situações sem ceder ao impulso de fugir, afinal, a vitória na aposta depende de sua resiliência emocional. O resultado é um duelo hilário de resistência, em que ambos se testam até os limites do bom senso, sem perceber que, em meio ao caos que criaram, um sentimento genuíno começa a surgir.
A graça do filme não está apenas no jogo de sedução e sabotagem, mas na forma como Petrie conduz a narrativa sem perder o timing cômico. Ele brinca com os clichês do gênero, mas os subverte ao colocar os protagonistas em posições que os forçam a confrontar suas próprias ideias sobre relacionamentos. Andie, que entra na aposta para expor os erros das mulheres em um namoro, se vê presa nos mesmos artifícios que ironizava. Ben, que se vangloriava de sua habilidade em conquistar qualquer mulher, descobre que o controle da situação escapa de suas mãos quando os sentimentos reais entram em cena.
A ambientação de “Como Perder um Homem em 10 Dias” também contribui para seu charme. Filmado em Nova York, o longa aproveita a energia cosmopolita da cidade para dar um tom sofisticado à narrativa, reforçando o contraste entre a vida profissional bem-sucedida dos protagonistas e o caos emocional que enfrentam. A química inegável entre Hudson e McConaughey sustenta grande parte da dinâmica do filme, tornando crível a transformação gradual da relação de conveniência em algo mais profundo. A sintonia entre os atores foi tão marcante que rendeu uma nova parceria em “Um Amor de Tesouro” (2008), reafirmando o carisma da dupla no gênero.
Além do sucesso comercial — arrecadando mais de 177 milhões de dólares mundialmente, um valor que triplicou seu orçamento de 50 milhões —, o filme consolidou seu status de clássico entre as comédias românticas dos anos 2000. Seu apelo atemporal se deve à maneira como equilibra ironia e afeto, fazendo com que o espectador se identifique tanto com o cinismo inicial dos personagens quanto com a vulnerabilidade que surge quando eles percebem que foram longe demais. No fim, “Como Perder um Homem em 10 Dias” não é apenas uma sátira dos relacionamentos modernos, mas uma lembrança de que, por mais que tentemos controlar o amor, ele sempre encontra uma forma de escapar às regras do jogo.
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