Há um paradoxo curioso em certos filmes de ação: eles oferecem o espetáculo visual e a promessa de aventura, mas deixam escapar o ingrediente essencial para serem realmente marcantes. Este é o caso aqui. Inspirado na famosa franquia de jogos da Naughty Dog, o filme busca se estabelecer como uma grande saga de caça ao tesouro, mas acaba esbarrando na ausência de uma identidade própria. Em vez de reimaginar o universo dos games, limita-se a uma coleção de referências óbvias, falhando em capturar o espírito que fez de Nathan Drake um ícone nos videogames. O resultado é uma obra tecnicamente competente, mas que se perde ao tentar copiar sucessos anteriores, sem compreender a alma que os tornava tão impactantes.
A jornada do protagonista, vivido por Tom Holland, começa com uma cena promissora: um despertar no céu seguido de uma queda vertiginosa. Este é um dos poucos momentos em que a adrenalina chega perto da intensidade dos jogos, trazendo aquela sensação visceral de urgência. Mas a empolgação inicial logo se dissipa, dando lugar a uma narrativa previsível, cheia de conveniências e soluções fáceis. Holland tenta injetar carisma em um Nathan Drake raso, prejudicado não só pela diferença de idade em relação à versão dos jogos, mas também pela falta de complexidade no roteiro. A história apresenta Drake como um bartender de Nova York com habilidades improváveis para roubos e acrobacias — uma combinação forçada e pouco convincente.
A dinâmica entre Drake e Victor “Sully” Sullivan (Mark Wahlberg) deveria ser o ponto alto da narrativa, mas se mostra um dos elementos mais frágeis do filme. Wahlberg, uma escolha discutível para o papel, parece deslocado, assumindo o papel de mentor sem carisma ou peso dramático. A relação central, essencial para o humor e a tensão das aventuras nos games, se resume a diálogos sem brilho e um jogo de desconfiança previsível. A falta de química entre os protagonistas enfraquece a imersão e prejudica o vínculo que a trama tenta criar.
A trama não ajuda a sustentar a narrativa. A busca pelo tesouro de Fernão de Magalhães segue um roteiro genérico do gênero: mapas antigos, diários enigmáticos, símbolos ocultos e um vilão aristocrático em busca da mesma fortuna. Antonio Banderas interpreta Santiago Moncada, descendente de uma família que teria financiado a expedição de Magalhães, mas seu personagem se resume a um antagonista raso, com motivações previsíveis. Para aumentar o conflito, surge Jo Braddock (Tati Gabrielle), uma mercenária implacável, mas tão superficial quanto Moncada, sem camadas que sustentem sua maldade.
Os desafios enfrentados por Drake e Sully carecem de tensão genuína. As pistas surgem e se resolvem com facilidade, sem o senso de desafio que torna os jogos tão envolventes. As traições são óbvias, e o desenvolvimento dos personagens é superficial. Chloe Frazer (Sophia Ali), que poderia adicionar dinamismo à trama, é reduzida a um papel previsível de aliada e rival, sem a complexidade necessária para tornar as transições interessantes. A previsibilidade enfraquece a narrativa, que não explora plenamente seu potencial.
Embora falhe na profundidade, o filme acerta na estética. As cenas de ação são bem coreografadas e o visual é exuberante. A sequência final, com navios piratas içados por helicópteros, é grandiosa, mas falta substância. A cena exemplifica o dilema do filme: é visualmente impressionante, mas não carrega peso emocional. A tentativa de equilibrar realismo com exagero cartunesco resulta em um tom inconsistente, incapaz de escolher entre a excentricidade e o drama.
Adaptações de videogames para o cinema raramente encontram o equilíbrio certo. “Uncharted” segue o padrão de outras tentativas frustradas, como “Tomb Raider” e “Hitman”, que não conseguem traduzir a essência interativa dos jogos para a tela grande. No entanto, filmes como “Detetive Pikachu” e “Sonic: O Filme” mostraram que é possível acertar quando há compreensão genuína do apelo do jogo. O filme tinha esse potencial, mas optou por uma abordagem genérica, apostando na nostalgia sem inovar ou oferecer algo que se sustente por mérito próprio.
A questão que fica é: este filme era realmente necessário? Se o objetivo era expandir o universo dos jogos e atrair um novo público, a resposta poderia ser positiva. No entanto, como uma tentativa de capturar a essência da franquia, o resultado é decepcionante. Para os fãs, pode soar como uma oportunidade perdida; para o público casual, é apenas um entretenimento passageiro. Em ambos os casos, a impressão final é de que faltou algo essencial — talvez a ousadia e a profundidade que tornaram os jogos tão inesquecíveis.
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