John Wells, renomado por seu trabalho em séries como “Plantão Médico”, “The West Wing” e “Maid”, traz para o cinema uma perspectiva intimista sobre os impactos da recessão de 2010. Em “A Grande Virada”, ele explora o desmoronamento de certezas financeiras e emocionais, inspirado pela experiência pessoal de seu cunhado, demitido após uma fusão corporativa. O roteiro se desenrola a partir do testemunho de três executivos que enfrentam as consequências brutais da crise.
O filme explora o universo cruel do capitalismo americano, onde a busca por sucesso é uma batalha constante e impiedosa. Wells articula essa realidade ao acompanhar as trajetórias de Bobby Walker (Ben Affleck), Phil Woodward (Chris Cooper) e Gene McClary (Tommy Lee Jones). Eles são atingidos por cortes massivos na empresa onde trabalhavam, revelando o abismo entre o poder corporativo e a vulnerabilidade individual. Bobby vê sua vida de conforto desmoronar, enquanto Gene lida com um impacto financeiro menor, e Phil enfrenta o desespero da demissão na maturidade.
Ambientado em Massachusetts, o enredo emerge de uma pesquisa minuciosa feita por Wells com pessoas que sofreram demissões em massa. Assim, a história ganha autenticidade ao expor o drama humano por trás das estatísticas econômicas. Bobby, que tinha um estilo de vida luxuoso, vê-se obrigado a aceitar um emprego na construção civil com o cunhado Jack (Kevin Costner). Gene enfrenta dilemas éticos ao testemunhar a ganância corporativa de Salinger (Craig T. Nelson), que lucra enquanto centenas de empregados ficam sem trabalho.
A narrativa mergulha na angústia de Phil, um homem que dedicou décadas à empresa, apenas para ser descartado aos 60 anos. A sua jornada destaca o custo emocional do desemprego e a frieza do mercado de trabalho. Em paralelo, Bobby é confrontado com a perda de status social, enquanto sua família luta para se adaptar a uma nova realidade financeira. Gene, apesar de ter menos prejuízos econômicos, sofre um vazio existencial ao questionar suas escolhas profissionais e morais.
O roteiro constrói um panorama de destinos distintos, revelando como fatores como idade, educação e classe social influenciam as chances de recuperação após a crise. Wells não busca vilões ou heróis; ao contrário, ele expõe as complexidades das decisões corporativas e das consequências pessoais. Assim, o filme evita abordagens simplistas, propondo reflexões sobre o valor do trabalho, a volatilidade do capitalismo e o peso das escolhas individuais.
“A Grande Virada” provoca o espectador a refletir sobre as injustiças estruturais do sistema econômico sem recorrer a discursos partidários. A narrativa é direta, mas rica em nuances, permitindo múltiplas interpretações sobre o custo humano das decisões empresariais. Ao final, Wells não oferece respostas fáceis, apenas um espelho incômodo da realidade contemporânea, onde o sucesso de poucos se apoia na queda de muitos.
A atuação do elenco é impecável, com destaque para Ben Affleck, que entrega uma performance comovente ao retratar a vulnerabilidade e o orgulho de um homem que luta para manter sua dignidade. Chris Cooper emociona ao transmitir o desespero contido de um trabalhador descartado no auge da experiência. Tommy Lee Jones traz profundidade ao seu personagem, equilibrando poder e arrependimento. O filme se torna uma análise poderosa da fragilidade do sonho americano.
Com uma abordagem sóbria e realista, “A Grande Virada” revela como a crise econômica expõe as falhas do sistema capitalista. Wells constrói um drama envolvente que ecoa experiências compartilhadas por milhões de pessoas ao redor do mundo. Ao optar por não impor julgamentos, ele convida o público a ponderar sobre as complexidades da sobrevivência em tempos de incerteza financeira. É um convite à reflexão sobre o preço da ambição e a busca pela estabilidade em um mundo imprevisível.
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