A série mais esperada de 2025, protagonizada por Robert De Niro, acaba de estrear na Netflix Jojo Whilden / Netflix

A série mais esperada de 2025, protagonizada por Robert De Niro, acaba de estrear na Netflix

Os Estados Unidos nunca mais foram os mesmos depois da fatídica manhã de onze de setembro de 2001. Às 8h46 daquele dia memorável pelas razões que mulheres e homens que prezamos pelos valores civilizatórios que nos possibilitaram chegar até aqui com alguma ordem queríamos esquecer, o terrorismo arreganhara os dentes para o mundo de maneira mais assustadora e definitiva, irrompendo um episódio que, felizmente, continua a inspirar o repúdio da comunidade internacional.

Autoridades omissas e ineptas têm sua imensa parcela de culpa no abismo de neurose e pânico que se formou junto à sociedade americana, onde vicejam lunáticos com uma ideia muito peculiar de Deus, uma entidade diabólica movida a rancor, intolerância, fúria e sempre ávida do sangue dos infiéis, chamados desse modo só porque atrevem-se a professar outras fés. “Dia Zero” ganha corpo a partir das mágoas de uma potência ferida, encarnada por um político experiente, que julgava já ter cumprido sua missão como servidor público. Consciência crítica da América, George Mullen, o ex-presidente interpretado por Robert De Niro, volta ao arriscado jogo da política externa, arrastando sua família para uma espiral de ciladas que perduram até o sexto e último episódio. Surpreendentemente vigoroso aos 81 anos, De Niro é, com a licença do trocadilho, o próprio salvador da pátria, o que não deixa de carregar uma generosa medida de sarcasmo quando se faz uma retrospectiva ampla em sua brilhante carreira.

Quanto mais tenta aprofundar-se no que efetivamente aconteceu nos bastidores do maior ataque à soberania americana em seu próprio território, mais a indústria audiovisual aumenta em nós a certeza de que havia e há alguma coisa muito errada com a América, sem nunca acenar para o isentismo hipócrita e covarde e sugerir que as vítimas — e a grande mártir de todas, a democracia dos Estados Unidos — tiveram alguma responsabilidade por seu suplício. Mullen, por seu turno, está pronto para mais um dia de sossego. Acorda sozinho numa cama de casal, caminha até o banheiro, toma seus remédios, dá umas braçadas na piscina, corre com o cachorro, até ligar a TV e ver que o país pega fogo, conflagrado por uma invasão cibernética tão devastadora quanto misteriosa.

Tarimbados, os autores Eric Newman, Noah Oppenheim e Michael Schmidt tiram todo o proveito que conseguem de um tema que qualquer um passou a assimilar desde o Onze de Setembro, contando com o carisma de uma personalidade que, embora hoje mansa, nunca teve medo de polêmica. O Mullen de De Niro aceita ajudar Evelyn Mitchell, a presidente de turno vivida por Angela Bassett, e chefia uma tal comissão Dia Zero, com poderes para investigar e prender sem mandado quem considerar suspeito. Não é possível se falar de George Mullen sem aludir a Travis Bickle, o justiceiro egresso da Guerra do Vietnã (1955-1975) que ronda Nova York ávido por “faxinar” a cidade em “Taxi Driver” (1976), o clássico de Martin Scorsese. Retirado do debate político por livre e espontânea vontade desde a segunda eleição de Donald Trump, em 6 de novembro de 2024, em “Dia Zero” De Niro volta a dar suas bofetadas com luvas de pelica. Mas dessa vez os Estados Unidos não têm nenhum Iraque para chamar de seu.


Série: Dia Zero
Criação: Eric Newman, Noah Oppenheim e Michael Schmidt
Ano: 2025
Gêneros: Drama/Suspense
Nota: 8/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.