A nostalgia é uma força poderosa no cinema. Comédias românticas já foram sinônimo de bilheteria garantida, embaladas por protagonistas carismáticos, roteiros afiados e um senso de escapismo irresistível. Mas há uma diferença fundamental entre capturar a magia do passado e simplesmente replicar sua estética sem substância. “Ingresso para o Paraíso” é um exemplo desse segundo caso: um filme que se apoia na memória afetiva do público e no carisma inegável de George Clooney e Julia Roberts, mas falha em justificar sua própria existência.
O problema central não está apenas na previsibilidade do enredo — embora seja impossível ignorá-la — mas na ausência de qualquer risco narrativo. David (Clooney) e Georgia (Roberts) formam um ex-casal que se une relutantemente para impedir que sua filha, Lily (Kaitlyn Dever), cometa um suposto erro ao se casar repentinamente com Gede (Maxime Bouttier), um agricultor de algas marinhas em Bali. A premissa poderia render diálogos espirituosos e um embate divertido entre os protagonistas, algo que, em teoria, justificaria a reunião dessas duas estrelas. Mas a construção da trama se contenta em ser um catálogo de situações previsíveis, onde cada conflito se resolve sem esforço real, cada piada soa ensaiada e cada momento “espontâneo” transpira artificialidade.
Se a ideia era resgatar a energia das comédias românticas dos anos 90, o filme se esquece de um detalhe essencial: não basta reunir dois astros consagrados; é preciso entregar um roteiro à altura. O charme inato de Clooney e Roberts é inquestionável, mas seu talento é desperdiçado em diálogos que giram em torno de farpas mornas e momentos de reconciliação que qualquer espectador atento enxerga a quilômetros de distância. A dinâmica entre os dois funciona em nível superficial — há uma química confortável, mas nada que resgate a faísca magnética de seus encontros anteriores nas telas, como em “Onze Homens e um Segredo” e “Doze Homens e Outro Segredo”.
A parte mais problemática, no entanto, é o romance central entre Lily e Gede, que deveria sustentar o enredo. O filme exige que o público acredite que uma jovem, recém-formada em uma prestigiada faculdade de Direito e prestes a iniciar uma carreira promissora, abandonaria tudo para se casar com um homem que conheceu há semanas. Não há tempo suficiente para construir a conexão entre os dois, tornando a decisão de Lily mais um artifício narrativo do que um dilema genuíno. O chamado “encontro fofo” entre o casal sequer merece essa descrição: falta encantamento, espontaneidade e, acima de tudo, credibilidade. Quando até mesmo um filme da Disney como “Frozen” ironiza a ideia de um noivado imediato, é estranho ver um longa contemporâneo tratar isso como premissa válida sem o devido desenvolvimento.
O cenário paradisíaco de Bali poderia ser um elemento enriquecedor, um contraste entre as visões de mundo dos personagens ou uma metáfora para suas transformações pessoais. Em vez disso, o filme o utiliza como mero pano de fundo turístico, explorando a cultura local de maneira superficial e caricata. As tradições matrimoniais são tratadas como um espetáculo exótico, sem qualquer aprofundamento que demonstre interesse real pelos costumes do lugar. A fotografia exuberante preenche a tela com imagens de praias imaculadas e resorts luxuosos, mas tudo parece mais uma campanha publicitária do que uma ambientação genuína.
Nesse contexto, um dos maiores desperdícios é a personagem Wren (Billie Lourd), a amiga espirituosa de Lily, que acaba relegada ao estereótipo da “melhor amiga engraçada”. Sua energia vibrante e irreverência trazem vida a cada cena em que aparece, mas a narrativa simplesmente não lhe dá espaço para crescer. É irônico que uma coadjuvante, relegada ao alívio cômico, consiga ser mais memorável do que a protagonista do suposto grande romance da história.
A verdadeira tragédia de “Ingresso para o Paraíso” não é apenas seu roteiro insosso, mas o fato de que ele representa uma oportunidade perdida para o gênero. Comédias românticas inteligentes e bem-executadas se tornaram raridade no cinema mainstream, e o retorno de astros como Clooney e Roberts poderia ter sido o ponto de partida para uma revitalização. Em vez disso, o filme apenas reafirma os estereótipos que fizeram o gênero perder relevância: histórias sem substância, personagens desprovidos de complexidade e tramas que tratam o público como meros consumidores de nostalgia diluída.
Se há algo que “Ingresso para o Paraíso” prova, é que carisma não substitui profundidade. Clooney e Roberts podem ser duas das últimas grandes estrelas de Hollywood, mas nem mesmo eles conseguem transformar um roteiro insípido em algo memorável. O brilho das comédias românticas clássicas nunca esteve apenas nos rostos dos protagonistas, mas na inteligência e no frescor das histórias que contavam. Sem isso, nem mesmo o paraíso é capaz de salvar um filme da mediocridade.
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