O thriller erótico de Michael Mohan tenta equilibrar mistério e sedução, mas acaba por tropeçar no próprio excesso de ambição. “Observadores” se apropria descaradamente de códigos hitchcockianos, o que nem sempre resulta em bom gosto. O terceiro ato revela a fragilidade dessa escolha, deixando uma sensação de artificialidade. Ainda assim, até chegar lá, o filme consegue manter o público imerso, conduzindo uma instigante reflexão sobre a obsessão pela vida alheia e o desejo de pertencer.
Essa inquietação contamina a rotina de Pippa e Thomas, um jovem casal que se muda para um charmoso prédio em Montreal e, sem querer, se depara com um segredo capaz de transformar tudo ao redor. A direção de Mohan imprime sofisticação à narrativa, amparada pela montagem precisa de Christian Masini, que desde os primeiros minutos revela a dualidade dos cenários onde a história se desenrola. A trama se molda como um jogo perigoso sobre aparências e expectativas, dissecando o desconforto de quem percebe que a própria existência talvez não seja tão especial quanto gostaria de acreditar.
No apartamento vizinho, Sebastian e Julia cultivam uma relação regida pelo erotismo e pela experimentação. Ele, um renomado fotógrafo, e ela, ex-modelo, compartilham um mundo de desejos através das lentes, criando uma realidade onde corpos e olhares assumem um papel primordial. O desaparecimento de Julia das sessões fotográficas abre espaço para outras mulheres, todas moldadas pelo mesmo padrão de beleza, todas atravessando a mesma coreografia sensual que se estende do estúdio para a intimidade conjugal.
Mohan conduz sua câmera de forma sedutora, ora privilegiando Pippa e Thomas, ora deslocando o foco para Sebastian e seus mistérios. As peças se movimentam a passos calculados, e a tensão cresce até a festa à fantasia no luxuoso apartamento de Sebastian. É ali que a trama acelera, revelando dispositivos engenhosos, como o uso de um espelho e um laser verde que permite captar conversas através do vidro. A partir desse ponto, contudo, a construção cuidadosa se desfaz, e o longa perde o rumo.
Mohan tenta amarrar os fios com soluções visuais que brincam com metáforas, como a profissão de Pippa, oftalmologista, ou a imagem de um ovo cozido cortado, preparando o espectador para um desfecho de consequências brutais. A fotografia valoriza corpos esculpidos e enquadramentos sugestivos, retardando a explosão final da trama até o último instante. No entanto, quando a reviravolta se apresenta, sua execução fica aquém da promessa. “Observadores” funciona como uma versão de “Janela Indiscreta” para a era digital, ampliando os recursos de vigilância e voyeurismo, mas sem a mesma inteligência narrativa do clássico de Hitchcock. Se a afirmação de Roger Ebert de que o valor de um filme está mais no “como” do que no “o quê” for levada a sério, Mohan quase acerta. Mas o “quase” pesa no balanço final.
★★★★★★★★★★