Tem no Prime Video: filme mais assistido dentre todas as atrações em plataformas de streaming em 2024 Divulgação / Universal Pictures

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Christopher Nolan é um cineasta cuja filmografia desafia constantemente o público, seja por narrativas não lineares, conceitos complexos ou inovações técnicas. Ele próprio já brincou com essa característica ao afirmar que seus filmes devem ser sentidos, mais do que compreendidos. Em “Oppenheimer”, essa abordagem se torna menos hermética. Ainda que a obra apresente densidade temática, não atinge o nível de abstração de títulos como “A Origem” ou “Amnésia”. O maior obstáculo para o espectador talvez seja a multiplicidade de personagens e a estrutura narrativa fragmentada. No entanto, entre seus trabalhos, esse se destaca como um dos mais acessíveis, sem comprometer a profundidade.

Com três horas de duração, “Oppenheimer” exige do público um envolvimento atento, à medida que constrói seu ritmo e desenvolve seus conflitos. O longa examina os dilemas éticos e morais de J. Robert Oppenheimer, físico que liderou o Projeto Manhattan, responsável pela criação da bomba atômica. Sua invenção resultou na morte de mais de 110 mil pessoas em Hiroshima e Nagasaki. Se, por um lado, acelerou o fim da Segunda Guerra Mundial, por outro, inaugurou a era da destruição nuclear e preparou o terreno para a Guerra Fria.

Apesar de sua inclinação política à esquerda e das ligações com o comunismo, Oppenheimer (Cillian Murphy) foi escolhido pelo general Leslie Groves (Matt Damon), líder do projeto pelo Pentágono, para encabeçar os esforços científicos. O objetivo era desenvolver uma arma que garantisse a supremacia militar dos Estados Unidos e neutralizasse a ameaça representada por Hitler. Oppenheimer, que possuía um rancho em Los Alamos, sugeriu a localização como sede do projeto, garantindo sigilo e isolamento para os cientistas envolvidos. O desenvolvimento da bomba se estendeu por três anos e custou aproximadamente dois bilhões de dólares, envolvendo extensos cálculos e reuniões para avaliar o impacto e as consequências do armamento nuclear.

Rumores de que Nolan poderia detonar uma bomba real para a produção geraram burburinho, mas, embora tenha alimentado a especulação, o diretor optou por um método engenhoso. O teste Trinity, a primeira explosão nuclear da história, é representado na tela com um clarão silencioso, seguido por um estrondo monumental, cuidadosamente trabalhado pelo design de som e efeitos visuais. A construção sonora desempenha um papel fundamental, criando momentos de tensão inesperada. A trilha intensa, os diálogos rápidos e sobrepostos, a atmosfera paranoica e o tom noir conferem ao filme uma identidade próxima ao suspense hitchcockiano. Fugindo da tendência contemporânea de recorrer ao CGI, Nolan priorizou efeitos práticos, utilizando miniaturas detalhadas para representar a explosão, conferindo autenticidade e impacto visual.

Na cinematografia, Nolan subverte um código visual tradicional: enquanto o preto e branco geralmente remete ao passado e o colorido ao presente, aqui ocorre o contrário. As cenas monocromáticas oferecem uma visão objetiva, capturando a realidade sob um ângulo externo, enquanto as sequências em cores mergulham na subjetividade de Oppenheimer, explorando sua psique e seus tormentos internos. Para esse efeito, a Kodak desenvolveu uma nova película de 15 perfurações, proporcionando uma qualidade de imagem superior e ampliando a expressividade do trabalho de Hoyte van Hoytema.

Cillian Murphy entrega uma interpretação meticulosa. Para viver Oppenheimer, perdeu 20 quilos, conferindo ao personagem uma fragilidade física que contrasta com sua presença intelectual. Seu desempenho captura a complexidade do cientista — um homem de postura aristocrática e autoconfiança inabalável, mas que, ao longo da trama, se vê engolido por forças políticas que antes o reverenciavam. Seu triunfo na criação da bomba logo se transforma em ruína: ao consolidar os Estados Unidos como potência nuclear e ditar o destino do Japão — já praticamente derrotado antes da detonação —, Oppenheimer se torna alvo de uma perseguição política implacável, conduzida por aqueles que outrora o celebravam.

“Oppenheimer” não se contenta em ser um simples relato histórico. Ao invés de um drama convencional, Nolan constrói uma experiência cinematográfica sensorial e intelectual, onde o peso das decisões e suas repercussões ecoam muito além da tela. A jornada do protagonista, marcada por glória e culpa, desenha um retrato pungente de um homem que, ao moldar o curso da história, também comprometeu sua própria existência.

Filme: Oppenheimer
Diretor: Christopher Nolan
Ano: 2023
Gênero: Biografia/Drama
Avaliação: 10/10 1 1
★★★★★★★★★★