Poucos espectadores associam Jack Quaid ao legado de seus pais, Dennis Quaid e Meg Ryan. Apesar de ter participado de produções como “Companheiro Vitalício”, “Oppenheimer” e a série “The Boys”, sua presença no cinema e na televisão nunca despertou grande atenção. Contudo, em “Acompanhante Perfeito”, ele tem a oportunidade de demonstrar um novo alcance ao interpretar Josh, um jovem que leva sua namorada, Iris (Sophie Thatcher), para passar alguns dias em uma propriedade luxuosa emprestada por um amigo. O local, isolado e sofisticado, parece um refúgio idílico, mas esconde uma trama de manipulação e traição que se desenrola com precisão cirúrgica.
Iris é reservada, sensível e parece carregar consigo uma bagagem emocional que a impede de se integrar totalmente ao grupo de amigos de Josh. Sua relação com Kat (Megan Suri) é especialmente tensa, já que a jovem não faz questão de disfarçar a hostilidade. O verdadeiro anfitrião da casa, Sergey (Rupert Friend), é um homem maduro, enigmático e cercado por rumores sobre a origem de sua fortuna. O que se diz é que seus negócios envolvem tráfico de drogas, armas e possivelmente de pessoas, embora nada seja confirmado. Kat, sua amante, parece plenamente satisfeita com esse arranjo. O casal Eli (Harvey Guillén) e Patrick (Lucas Gage) completa o grupo, e Josh, por sua vez, demonstra irritação crescente com a insegurança de Iris, tornando-se cada vez mais distante e impaciente.
A tensão latente se intensifica na primeira noite. Iris percebe olhares suspeitos entre Josh e Kat e, embora desconfortável, tenta ignorar a situação e manter o namorado por perto. Sua insistência em agradá-lo pode parecer ingînua e frustrante para o público, mas logo os eventos revelam camadas mais profundas. Em um momento a sós à beira do lago, Sergey a ataca e tenta forçá-la a beijá-lo. Quando Iris resiste, ele reage com violência. Em desespero, ela encontra no bolso uma faca que misteriosamente apareceu ali e a usa para se defender, matando Sergey. Desnorteada e coberta de sangue, retorna à casa e relata o ocorrido. Josh, em vez de tranquilizá-la, ordena que Eli chame a polícia e, sem hesitação, amarra Iris a uma cadeira, impedindo-a de fugir.
Então, vem a grande revelação: Iris não é humana. Ela é um robô programado pelo próprio Josh. O ataque de Sergey fazia parte de um plano meticulosamente elaborado por Josh e Kat para provocar uma reação violenta de Iris e garantir a morte do magnata, permitindo-lhes roubar os 13 milhões de dólares guardados em um cofre na casa. A faca havia sido colocada no bolso dela por Josh, que esperava que ela reagisse de maneira previsível. No entanto, o que parecia um plano perfeito rapidamente sai do controle.
Iris escapa antes da chegada da polícia, desafiando seu próprio código de programação. Agora, ela precisa lutar por sua sobrevivência, ainda que sua existência não seja exatamente uma “vida” no sentido convencional. A narrativa se desenrola com reviravoltas intensas, colocando cada personagem em situações extremas e obrigando-os a improvisar para garantir a própria segurança.
Com direção e roteiro de Drew Hancock, “Acompanhante Perfeito” transcende o suspense tecnológico ao traçar uma poderosa metáfora sobre relações abusivas. A trama expõe como mulheres subjugadas são manipuladas para atender aos caprichos de homens inescrupulosos. A jornada de Iris ecoa a luta real de vítimas de abuso, para as quais a liberdade é um caminho doloroso e repleto de retrocessos.
Um detalhe simbólico é a forma como a personalidade de Iris pode ser ajustada por meio de um aplicativo no celular de Josh, evidenciando o nível de controle que ele exerce sobre ela. Mas é justamente ao se libertar que Iris decide levar o celular consigo, em um gesto que sugere a retomada do próprio destino.
Em determinado ponto da trama, ela acaba novamente sob o poder de Josh, refletindo um dos aspectos mais cruéis do ciclo de abuso: a dificuldade de escapar definitivamente de um agressor. O filme ilustra como esse padrão se repete, muitas vezes várias vezes, até que a vítima finalmente consiga romper com ele.
Equilibrando tensão e reflexão, “Acompanhante Perfeito” oferece um thriller instigante que mistura ficção científica e crítica social. O longa convida o espectador a abraçar sua premissa incomum, entregando uma experiência intrigante e, ao mesmo tempo, uma mensagem contundente sobre autoconhecimento e emancipação.
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