Como todos os prazeres de que o homem desfruta e contra os quais flagra-se numa batalha encarniçada, tentando se libertar e cada vez mais enredando-se em seus fios, feito a mosca na teia da aranha, o amor tem predicados e defeitos de que se gosta ou se desgosta em maior ou menor proporção, despertando assim reações as mais imprevisíveis a depender de quem atinja. Em menos de um segundo passam-se décadas e já não parecemos mais tão novos; esperamos que alguém nos desperte antes de sair, e impeça que o sol se ponha nas nossas costas sem que possamos nos defender.
Talvez a melhor imagem para definir um relacionamento seja mesmo a de um barco singelo, resoluto no propósito de não virar no oceano de prazeres, lamentações, desencontros e mágoas, que sempre pode tornar-se, de uma hora para a outra, ou um lago cinzento de melancolia e frieza, ou um golfo, no qual o ódio fica a entrar e sair, provocando seus estragos por um ano, uma década, uma vida. Ninguém ama impunemente, como a filipina Cathy Garcia-Sampana faz questão de lembrar-nos em “Hello, Love, Again”, a continuação de “Hello, Love, Goodbye” (2019), um conto de fadas pós-moderno sobre acertos e desacertos românticos envoltos nas pendengas do lumpesinato. Uma nova especialidade da indústria cinematográfica das Filipinas.
O verdadeiro amor leva muito tempo para se realizar em plenitude, o que significa passar por cima das próprias vontades, bater de frente com as opiniões e conceitos ditos certos, abdicar dessa mesma certeza em nome do que o outro considera imprescindível à felicidade, sua e do casal, ainda que se saiba muito bem aonde levarão os tantos sonhos que nascem defuntos, sem qualquer chance de vingar, de um e do outro. O roteiro de Olivia M. Lamasan, Carmi Raymundo e Crystal S. San Miguel vai e volta no tempo, começando no inverno de 2019, ponto de partida do primeiro longa, quando Joy Marie Fabregas e Ethan del Rosario se conhecem e trocam juras de amor eterno, sem saber que atravessariam um torvelinho de emoções, irrigado por apuros de dinheiro. A enfermeira Joy, a anti-heroína de Kathryn Bernardo, muda-se de Hong Kong para Calgary, no norte do Canadá, para dar expediente como babá na casa de uma compatriota, mas logo cai das nuvens ao ser escorraçada e achar-se sem trabalho e moradia. A pandemia de covid-19 é a gota de desespero que faltava para fazer transbordar o balde, e agora Ethan, que há pouco viera do outro lado do mundo, também passa por vicissitudes graves e, claro, não há benquerer que resista.
“Hello, Love, Again” transmuta-se num dédalo algaraviado em que a diretora registra as conflitantes vontades de seus protagonistas.
Bernardo encarna a ambivalência moral de Joy, ao passo que Alden Richards corresponde ao talento da colega na pele de um galã frágil, bem ao gosto da plateia feminina chegada ao gênero. A propósito, não há manifestação artística em que essa tendência fique mais óbvia que nas comédias românticas asiáticas, e no caso específico das produções filipinas, estica-se a corda ao máximo, decerto para mascarar o que se tem no chão duro da vida como ela é.
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