Inspirado na comédia francesa “Merlusse”, de 1938, o novo longa de Alexander Payne, “Os Rejeitados”, indicado a cinco prêmios no Oscar 2024, chega aos cinemas com um olhar nostálgico e intimista. O roteiro, assinado por David Hemingson, resgata vivências do próprio autor em um internato e a relação com um tio, moldando uma narrativa que se equilibra entre a rigidez acadêmica e a redescoberta de laços humanos. Filmado inteiramente em locações reais, o longa aproveita o rigoroso inverno de Massachusetts para capturar a autenticidade das cenas, com tempestades de neve genuínas, registradas durante as férias escolares na Fairhaven High School.
Alexander Payne, que já dirigiu “Os Descendentes”, aposta novamente em um protagonista complexo, vivido por Paul Giamatti. Paul Hunham, um professor de história cínico e antissocial, carrega um olho de vidro e sofre de Trimetilaminuria, condição rara que lhe confere um odor peculiar. Intransigente na avaliação de seus alunos, considera-os intelectualmente medíocres e se recusa a aliviar suas notas. Sua postura inflexível e desdenhosa o torna alvo do desprezo coletivo, alimentando um ciclo de hostilidade com os estudantes do internato.
Entre aqueles que o desprezam está Angus Tully (Dominic Sessa), um dos cinco alunos obrigados a permanecer na escola durante as férias de fim de ano. Hunham, ao lado da cozinheira Mary Lamb (Da’Vine Joy Randolph) e do zelador Danny (Naheem Garcia), é encarregado de supervisioná-los. No entanto, pouco antes do Natal, os pais dos demais alunos os retiram da escola, deixando apenas Angus, Mary e Hunham no campus praticamente deserto. Esse trio improvável, cada qual com suas dores e frustrações, acaba desenvolvendo uma conexão inesperada.
Mary, que recentemente perdeu o filho, é uma das poucas pessoas que Hunham respeita, e Angus, com sua inquietação e rebeldia juvenil, desafia o professor de formas que ninguém mais se atreve. O convívio forçado transforma as barreiras erguidas entre eles e revela nuances que vão além das aparências, demonstrando que nem sempre somos aquilo que projetamos ao mundo. É nessa convivência que o rigoroso professor e o jovem aluno encontram, de forma hesitante, um espaço para compreensão e crescimento.
A produção marca a estreia de Dominic Sessa no cinema, um talento descoberto em testes teatrais e fortemente apoiado por Paul Giamatti, que persuadiu Payne a dar-lhe o papel. Inicialmente relutante devido à inexperiência do ator, o diretor acabou convencido pelo carisma e entrega de Sessa, que brilha na tela com naturalidade.
Embora ambientado nos anos 1970, o filme foi inteiramente rodado com câmeras digitais, e sua estética granulada e os tons pastéis são fruto de ajustes minuciosos na pós-produção. A atmosfera nostálgica se alinha à proposta narrativa e dialoga com clássicos como “Ensina-me a Viver” (1972) e “Os Incompreendidos” (1959), que também abordam a relação entre figuras de autoridade e jovens marginalizados pelo sistema educacional.
Indicado nas categorias de melhor filme, melhor roteiro original, melhor ator, melhor atriz coadjuvante e melhor edição, “Os Rejeitados” oferece interpretações sensíveis e uma condução que oscila entre o humor sutil e o drama comedido. No entanto, apesar de sua qualidade inegável, talvez não possua o impacto necessário para conquistar as principais estatuetas da premiação. Ainda assim, sua delicadeza e autenticidade garantem um lugar entre as histórias que perduram na memória.
★★★★★★★★★★